terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Toda solução cria novos problemas

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Passa o tempo e as pessoas ainda continuam com o mesmo papo de fim de ano. Que o ano passou na frente dos olhos, e como foi rápido. È claro que o ano passa voando quando se é lembrado no final dele, ninguém diz isso no meio do ano. Aí todos resolvem estabelecer, sem menosprezar ninguém, suas malditas metas. A grande maioria e suas metas pessoais, mas pensando sempre nos olhares atentos do outros. Riqueza para fazer inveja, provar que um dia chegou lá. Emagrecer, não pensando na saúde, mas sim para ter um corpo perfeito para os outros apreciarem. Para mim não passam de fantoches ensaiando o teatro dos setes pecados capitais.

Em tempos que pessoas se preocupam com o verão eu queria saber era de encher a cara e comer tudo que puder. Eu lá iria me preocupar com regimes ou metas na única época do ano que sobrava um pouco de dinheiro para desfrutar dos meus humildes prazeres.

Levanto e não penteio o cabelo, ando pela casa o dia inteiro de cueca, executo no mínimo dois cochilos por dia e banho um dia sim outro não. Era simples a matemática de quem trabalha o ano inteiro. Engraçado?! Engraçado mesmo era minha pessoa tomando cerveja naqueles copos de requeijão de vidro da Turma da Mônica (pelo menos em casa, assim que acabava o requeijão, são reaproveitados os copos é claro).

Maurício de Souza para mim é e sempre foi um ídolo. Naqueles velhos gibis, ainda de papel de jornal, ele descrevia com detalhes minha infância. Aquela malandragem de bairro, de amigos de rua não existe mais em uma geração apenas cinco ou sete anos mais nova que eu. Fui ter meu primeiro celular com 18 anos e vivia desligado, jogado ou quebrado. Ridículo pensar, mas eu já estava velho para entender algumas coisas.

Infelizmente eu vejo uma juventude cada vez mais desinteressada pelos fatos ao redor delas, apenas cegamente olhando para o próprio umbigo e sendo cada vez mais egoístas. Todos passam por uma fase que se acham o tal, isso é perfeitamente normal, mas eu não enxergo somente isso. Existe algo além, do tipo uma teoria da conspiração, que ainda não consigo entender.

Terminei meu cigarro e tomei meu ultimo gole de cerveja já quente. Preciso perder a mania de começar a escrever como um desabafo e acabar terminando com um apelo.


sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

A luz que incide sobre ele

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“Qual o problema com você? O que afinal anda acontecendo? Jogar, amar, servir, receber, vencer e falhar já não é mais suficiente? Ouvir, explicar, lutar e tentar entender já não é tão importante assim? Fugir, se esconder, observar e correr por outro caminho anda te cansando, não é mesmo?”

“Você sabe que tudo não passa de uma grande brincadeira? Que todos olham por si e querem, a todo custo, passar por cima de nós e deixar os restos espalhados pelo tapete? Que ninguém se lembraria de limpar os cacos que você quebrou? Sabe que, no fundo, tudo anda uma grande porcaria? Que só tende a piorar? Tem certeza que o mundo, hoje, é um grande barril de pólvora esperando que o primeiro lunático jogue brasas ao chão, não é?”

“Ainda querendo compor e cantar? Escrever e lembrar? Entreter e mostrar? Entorpecer e chorar? Por quê? Esqueceu-se que não existem mais novidades? As ruas, por mais cheias que estejam, continuam sempre vazias? Vazias como o seu coração ou como sua mente? Não sente mais seu coração bater, lembra-se? As veias pulsarem? O calor do sol? Não percebe que o último cliente já se foi e você continua sozinha sobre o balcão?”

“Os sentimentos já não valem nada, entende? O caráter e a dedicação perderam seu espaço? A saudade e a nostalgia só te confundem? Você não sente, não ouve e nem mesmo enxerga o poder da verdade, recorda? Onde escondeu sua montanha de mentiras? Em que lugar acha que vive, afinal? Eu não entendo, você não entende e ninguém mais nesse mundo se esforça para tentar entender?”

“E por que, meu Deus? Por que continua lutando? Por que ainda guarda esperanças? Por que ainda acredita e busca um amor verdadeiro? Por que continua a sorrir? E por que, apesar de tudo, ama tanto essa vida? Você é muito mais estranha do que eu imaginava, sabia?”

Colocou as mãos embaixo d’água que corria e lavou o rosto com muito cuidado. Manchou um pouco o pijama, mas não se importou. Escovou os dentes e depois guardou a escova no armário. Olhou seu reflexo mais uma vez e parou um segundo para refletir: “Talvez seja melhor tirar este espelho daqui.”

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Enquanto você dormia

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Não saberia explicar o que ele fazia ali parado durante tanto tempo, imóvel e olhando para o mesmo lugar há horas. Também não poderia explicar o que fazia eu, aqui, imóvel, olhando para ele há um bom tempo. Alguma razão para estes atos deveria existir, para ele ou para mim, só que ainda não havíamos descoberto qual.

Um mendigo, sujo, fétido e, ao que parecia, extremamente louco e atento para o que estava acontecendo dentro de sua mente. Com um cobertor imundo nas mãos e apenas uma bermuda cobrindo o corpo, se divertia sozinho e ria do que somente ele poderia explicar. Já eu, um jovem “rico”, limpo, bem vestido e, ao que me lembrava, aparentemente sóbrio o bastante para não me entreter com tudo aquilo, perguntava-me o que estávamos realmente fazendo. Seria melhor parar um segundo para refletir se o louco era ele ou eu, afinal.

Quando levantei, atravessei o portão em passos lentos e me dirigi à rua. O chão estava coberto de lama e meus sapatos brancos, completamente sujos. No momento em que voltei os olhos a um ponto fixo a minha frente, senti um vulto se aproximar em um movimento extremamente rápido. Sem esforço algum já havia me jogado ao chão. Levantei-me como um raio, mas fui nocauteado na mesma intensidade. Estava tudo muito claro e por mais que abrisse os olhos, nada podia ver. Quando finalmente minha visão retornou, trouxe consigo uma dor incrivelmente forte em meu maxilar. Percebi que o sangue escorria por meus lábios, enquanto me arrastava pela lama tentando entender o que estava acontecendo. Não fazia a mínima idéia sobre o que havia me atingindo, mas somente um tolo não perceberia que as coisas já não andavam bem.

Enquanto meu estado de consciência voltava ao normal, pude ver que o mendigo, já não mais imóvel, era o meu algoz. Mais um impacto estrondoso em minhas costelas e deitei-me ao solo para gemer e cuspir o resto de sangue que, agora, me inundava a boca. Meu companheiro sorria como um inocente menino e possuía uma pequena faca nas mãos. Seus dentes eram de ouro e apesar do ato hostil, não senti raiva ou maldade em suas intenções, mas isso não fazia minha dor diminuir. Esforcei-me para tentar fugir, porém um olhar inóspito do inimigo me paralisou. Não havia nada nem ninguém, apenas uma força invisível que me impedia de mover até mesmo os dedos dos pés.

Com as costas no chão, senti os pingos da chuva começarem a cair. Ele se aproximou e se ajoelhou próximo ao meu tronco. Proferiu palavras que não podia entender e apunhalou meu estomago com a arma. A dor não veio, mas um pavor intenso dominou meus pensamentos. Seria esse o fim? Enquanto abria meu corpo e arrancava, um a um, meus órgãos, pensava nos amores que havia deixado para trás, nos amigos e familiares que jamais voltaria a ver e no tempo perdido em vão.

Meu coração já estava em suas mãos e minha vida já não me pertencia mais. Pingava e batia mesmo estando fora do corpo. Ele se levantou com o órgão em sua mão direita e, simplesmente, deixou os restos ali ao meu lado. Por que? Talvez para que antes da morte tivesse o prazer de entender que, apesar de tudo, por dentro, somos todos iguais. Apenas sangue e carne. Antes de ir embora, jogou seu cobertor sobre meu corpo e se despediu. Dobrou a esquina enquanto o temporal caía. “Adeus” foi a única palavra que realmente pude compreender.

Fazendo minhas últimas reflexões, minha visão ficava cada vez mais turva e escura. O sangue e as gotas da chuva davam-me uma leve sensação de bem estar. Não pensava mais em arrependimentos e, muito menos, no que poderia, um dia, ter feito. O último desejo era que pudesse ver seu rosto uma última vez. Tudo escureceu e me despedi do mundo pensando nela.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Talvez


Talvez faça sol ao amanhecer

Talvez não

A chuva pode continuar ainda por muito tempo

Mesmo que acabe me esquecendo de lhe dizer adeus


Talvez levante e não me lembre mais

Que tudo já não possui tanta importância assim

Talvez não

É justo fingir por quanto tempo?


Talvez não tenha mais tempo para acreditar

Que o engano, algumas vezes, se confunde com o pecado

Amor, paixão, luxúria?

Talvez não


Talvez não

Nunca lhe disseram até onde chegaria o seu limite?

E o quão difícil seria partir?

Lidar com o fracasso te deixou extremamente vulnerável


Seria injusto prever?


Talvez...

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

O mar tá aí pra peixe

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A chuva estava perto de cair, podia sentir o cheiro do molhado como já tivesse despencado. Meu dia se encontrava em um domingo entediante e sem ocupação alguma. Me sentia um pouco inútil naquele momento, pois não fazia nada por ninguém e nem por mim mesmo. A boa noticia que, ali estirado no meio do quarto, nem ligava para isso. Como de costume, em certas horas a solidão faz de você um grande estudioso de si mesmo. Há essas alturas eu já tinha doutorado nessa matéria. Meu único defeito era que eu não conseguia assumir metade dos meus erros.

Tocava “Fever Dog” no radio e eu cantava sozinho. Fiz uma pequena comparação com o Snoopy, na cena que ele fica em cima da casinha. Talvez fosse exatamente a posição que eu estava fazia uma hora. O calor sufocava toda vez que eu lembrava que estava quente, que ironia não, pensei comigo mesmo. Com uma musica, nada para fazer e sem vontade algum de escrever algo recorri a velhos pensamentos. Reflexão é algo incrível, até você reparar que aquele erro que tentou corrigir falhou algumas vezes. Bastou cinco minutos para mandar tudo para a puta que pariu e pensar em algo decente.

Aí me lembrei de uma noite interessante, que havia quase deletado da minha mente. Subia de madrugada, em uma daquelas noites difíceis, uma rua a caminho de casa. Seguia a passos lentos, e o sereno não estava lá ajudando muito na minha volta. De repente, em um daqueles latões de entulho, pula um mendigo negão, mas todo branco, sujo de pó branco. Arregalei o olho e fiquei imóvel, fixando o olhar na cara dele. Foi quando ele me disse:

- Argh! – Cuspiu no chão e reclamou - Ainda bem que a porra do Cal me aquece – disse em um tom de bêbado mais engraçado que já tinha escutado.

Eu ainda estava perplexo, não sabia o que dizer. Então ele olhou para minha cara e disse:

- Que foi meu chapa?! Nunca viu não?

- Um negão de beiço pequeno não! – respondi sem pensar muito.

Nós dois ficamos parados por volta de uns dois segundos, foi rápido e longo ao mesmo tempo, difícil de explicar. Então ele sorriu, faltando alguns dentes, e me deu um abraço. Eu apenas ri junto com ele, seu abraço foi de alegria, alguém havia dado atenção e feito ele rir. Tem pessoas que sofrem muitas carências nesses aspectos. Dei minha toca e um moleton que estava debaixo da minha blusa e fui embora.

Então levantei do chão e fui na varanda acender um cigarro. Domingo é como ser fuzilado, você sabe que no final você vai se fuder de qualquer jeito, e seguindo o pensamento, segunda então é a bala no cérebro. Que domingo entediante, pensei, olhando para uma lagartixa que, ali imóvel, me encarava...

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Simplesmente assim

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Estava sentada com as pernas cruzadas e o braço esquerdo apoiado sobre a mesa, com o garfo entre os dedos. Na mesa, um pequeno prato contendo uma porção de salada de frutas. Era linda, loira e possuía a pele clara como a neve. Apenas sua presença acabava deixando aquela, sem graça, praça de alimentação, no mínimo, muito mais interessante.

Vestia uma camiseta preta bastante feminina e uma calça jeans comum e extremamente simples, mas que a tornava ainda mais bela. O cabelo loiro e liso estava jogado para trás por sobre os ombros e deixava seu rosto único livre para que todos pudessem apreciar.

Duas pulseiras, uma em cada braço, a tornavam ainda mais elegante e um anel prateado no dedo anular de sua delicada mão direita entristecia todos a sua volta, pois agora sabiam que ela era uma mulher comprometida.

Como se nada pudesse interrompê-la, delicadamente continuava a comer e fazia pequenos intervalos para poder nos agraciar com um inesquecível e inocente sorriso, que, sem alguma real intenção, encantava todos que estavam ali presentes.

Assim que terminou, levantou cuidadosamente e andou em passos lentos para jogar seu prato fora. Voltou e, sorrindo, se despediu. Enquanto subia a passarela, podíamos observar a tatuagem que cintilava em sua cintura pelo pequeno espaço entre a camiseta e a calça, e o qual deixava sua macia pele à mostra. Enquanto continuava seu caminho, pude perceber que, sem expressar nenhum esforço para se destacar dentre os demais, todos paravam para observar que ela estava, mais uma vez, indo embora.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Toda rosa possui o seu espinho

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Costumam dizer que toda rosa possui o seu espinho. Talvez o da minha estivesse cravado no fundo do meu coração ou simplesmente nas entranhas de todo o meu orgulho. Às vezes tento parar para pensar no que não deu certo e não consigo entender onde foi que cometemos o primeiro erro.

Sorte que temos tempo para nos valorizar. Nem sempre a culpa por não ter dado certo é minha, sua ou deles. Muitas coisas acontecem a nossa volta de tantas formas diferentes que não é possível se esquivar de todos os pequenos problemas que, juntos, se tornam relativamente grandes.

Mas no fundo sabemos que poderíamos ter sido uma das melhores coisas que aconteceram em sua vida e a outra pessoa nem ao menos se dará conta disso. Tudo bem! A vida continua e sou realmente grato por pessoas apaixonantes surgirem a nossa volta a todo o momento. Alguns se esquecem que ainda há tempo para o romantismo ou simplesmente viver um grande amor apenas por uma noite.

Sabemos que pequenos eventos podem ser bastante significativos. Talvez voltar sozinho na estrada de madrugada, ouvindo um de seus discos favoritos e acompanhar o amanhecer enquanto dirige se torne uma das sensações mais valiosas em muito tempo. Nunca subestime a vida, pois o mais simples de tudo pode mesmo te surpreender.

Seria ótimo se o sol voltasse, aos poucos, a brilhar.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Frases II

“O mundo se transforma em um lugar muito melhor após o anoitecer.”

“Não importa o que deseje, você não poderia estar em melhores condições.”

“Apaixonei-me em uma fração de segundos, mas já estarei livre assim que ela dobrar a esquina.

“Por menor e menos significantes que sejam alguns momentos, a vida pode ser muito melhor do que esperamos dela.

“Tentei ser sincero comigo mesmo e percebi que nem com a minha própria pessoa tenho facilidade em mostrar o que realmente sou.

“O sol tem um brilho diferente a cada novo dia.”

“É engraçado como podemos nos lembrar de algumas sensações sem que nos esforcemos para isso.

“Apesar de nunca estarmos fazendo nada, acabamos sempre fazendo tudo ao mesmo tempo.

“Deveríamos nos preocupar mais em apreciar as cores vibrantes do céu que somente o pôr do sol é capaz de nos propiciar.”

O mundo que vivemos é diferente para cada um de nós.

“Poderia escrever uma canção para cada sentimento que o invadia.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Linhas Brancas Horizonte Cinza

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Após algumas horas de viagem o ônibus chegou ao destino como o planejado. Desta vez me perecia que não tinha deixado absolutamente nada para trás. Ainda mais quando o parecia que o momento havia feito um ensaio com a paisagem, pois estava tudo em seus lugares em uma sintonia perfeita. Alguns raios de sol davam sua graça em meio aquele imensidão de nuvens, que rapidamente sumiam pouco á pouco para o dia, enfim, ficar ensolarado. Choveu boa parte do caminho e o cheiro de terra já exalava forte.

Desci em uma pequena e velha rodoviária bem típica de interior. Com algumas partes rebocadas bem visíveis, uma linha de poeira sobras suas paredes e as ruas, onde trafegavam automotores e charretes, eram de paralelepípedo. Havia aos montes grupos de velhos espelhados pelo local inteiro. Talvez sejam os maiores frequentadores de rodoviárias interioranas.

Minha primeira vontade era de tirar o tênis e andar descalço. Fui covarde, não fiz. Então tratei de comer algo rápido, como coxinha, quibe ou algo parecido. Mas tudo sem pressa nenhuma, faltava apenas quinze para meio-dia. Sentei no balcão e tirei da minha mochila meu caderno (com aspiral de barbante, pois o original tinha quebrado inteiro) e comecei a escrever algumas idéias.

Fui interrompido por um senhor que disse algo muito rápido e começou a rir logo em seguida. Olhei para sua cara e percebi nitidamente que não havia maldade no que tinha me dito, tinha cara de ser boa gente. Ri junto, sem motivo, fui simpático. Ofereci-lhe um café e se recusou, mas me pediu um cigarro. Pegou, agradeceu e foi embora. A essa altura achava isso tão normal.

Fiz meu pedido e passei a olhar em volta. Tinha lá sua loja de doces e salgados que não havia nem espaço para andar. A loja de tranqueiras de diversos tipos de coisas que você pode imaginar, úteis e inúteis. Uma loja de roupas e as cabines de compra das passagens. Algumas pessoas e cachorros circulavam por lá e um velho relógio de corda anunciava meio-dia.

Meu tempo parou por uns instantes e meu pedido tinha chego. Senti falta da minha garrafa de cerveja, então acenei com a mão para alguém. Estava pegando a moeda no chão e assim que levantei a cabeça deparei com dois olhos grandes e esverdeados, no entanto o que mais tinha chamado minha atenção foi seu sorriso. Ouviu meu pedido sorrindo e assim trouxe do mesmo jeito. Invejável. Ela tão cheia de vida e eu lá, pobre de espírito. Simplesmente não fico sem São Paulo, mas começou a me fazer bem uma fuga.

Terminei minha refeição sem pressa alguma, e ela disparando sorrisos para todo lado. Fechei a conta e deixei uma gorjeta gorda para a atendente sorridente. Tinha achado alguém feliz com a vida. Arrependi-me da gorjeta. Ao invés de elogia-la pelo seu sorriso contagiante preferi pagar por ele com uma gorjeta. Ridículo. Pois é, vivendo e aprendendo.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O despertar de um sonho

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Esperar por respostas nunca fora sua verdadeira intenção. Sozinho em seu quarto, compondo e se esforçando ao máximo para analisar os erros que o impediram de mostrar seu verdadeiro potencial, se afogava em mágoas que nunca mais o abandonariam.

Poderia escrever uma canção para cada sentimento que o invadia. A essa altura, já eram muitos e formavam um redemoinho intenso que atingia seu peito em uma chuva de ardor e farpas.

Observando as luzes dos carros que refletiam pelo teto, começou a imaginar um mundo mágico no qual todos eram felizes. Onde os raios do sol cintilavam belos a cada manhã e o fracasso não atingia, nem mesmo, o menor dos seres. Podia correr entre as arvores e sentir a brisa deliciosa do verão. Ser amado e poder retribuir de forma verdadeira tal sentimento. Um mundo que, simplesmente, conseguisse voltar ao lar e mostrar um sorriso sincero sempre que se olhasse no espelho.

Sentado a beira de um magnífico lago, ele podia ver uma linda mulher que nadava tranquilamente pelo caminho do horizonte. O por do sol deixava sua silhueta ainda mais intrigante e sabia, mesmo sem nunca tê-la visto, que o momento de conhecê-la era aquele. A garota emanava uma energia incrível e por alguma razão, podia sentir que ela o chamava. Começava a perceber que todos os pensamentos eram guiados em sua direção. Resolveu, aos poucos, tirar suas roupas e deixá-las de lado. Quando a última peça atingiu o solo, aproximou seus pés do lago e deixou que o instinto lhe guiasse.

Nadando pelas águas mornas, lentamente foi se aproximando da garota e, finalmente, conseguiu visualizar nitidamente seu rosto. Era lindo e misterioso. Por mais que tentasse, não reconhecia, mas tinha certeza que era familiar. Os olhos negros e a pele clara como a neve o impressionavam, pois ao longe não conseguia perceber que, na realidade, a garota era ainda mais linda do que imaginava. Os cabelos escuros refletiam a luz do sol, e o sorriso sincero o emocionava de uma forma única que sua juventude não lhe permitia entender.

Enquanto se aproximava, se deu conta que a garota, agora, também nadava em sua direção. Os olhos dela iam de encontro aos seus. A água rebatia levemente em seu rosto e sua visão era preenchida pela chegada de sua desconhecida companheira. Quando se aproximaram, já era possível sentir a respiração ofegante de cada um. Cessaram o nado e passaram a se olhar sem nunca deixar de estampar um sorriso no rosto.

Alguns minutos se passaram e ele tinha a impressão que nunca havia sido tão feliz em toda sua vida. Aquele simples momento, um olhar e um pequeno sorriso haviam mudado sua breve existênica para todo o sempre. Com um gesto suave, ela estendeu sua mão direita para fora da água e proferiu seu nome. Ele entendeu o gesto e fez o mesmo. Suas mãos se aproximaram e, em um toque suave, se uniram. A felicidade invadiu seu corpo e um amor esquecido e solitário voltou a preencher seu coração.

As luzes no teto de seu quarto continuavam a brilhar, mas agora podia sentir com clareza a respiração suave da mulher que dormia abraçada ao seu lado, com a cabeça apoiada docemente em seu ombro e a mão direita que, agora, jazia solenemente sobre a sua. Havia por um momento se esquecido do que era realmente importante em sua vida. Sentia-se muito bem. Sorriu, fechou os olhos e, finalmente, adormeceu.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Caixa de entrada

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Ainda escrevia procurando uma razão qualquer onde eu conseguisse me expressar com clareza. Algumas pessoas andavam me cobrando isso, mesmo que indiretamente. Realmente estava abusando do silêncio em ocasiões fora do necessário. Seria uma boa ocasião aquele certo desabafo com alguém. Uma hora todos precisaram. Quem costumava falar demais com as paredes havia se cansado de nunca obter respostas delas. Era a hora necessária para ganhar a estrada.

Mas antes mesmo de dizer um até logo fui conferir a caixa de e-mail buscando alguma notícia interessante. Minha caixa de e-mails continha correntes, vagas de empregos com absolutamente nada parecido com meu perfil, anúncios imprestáveis e avisos urgentes sobre algum acontecimento. Tirando toda essa porcaria generalizada havia um e-mail que nunca tinha chamado minha atenção, mas claro que dessa vez havia despertado um interesse fora do comum. Era uma colega dos tempos de faculdade que fazia algum tempo que não tinha notícias. Na faculdade mal conversávamos, ela apenas possuía o meu e-mail para tal eventualidade dentro da sala. Mesmo assim achava ela uma boa pessoa e não tinha nada contra.

O e-mail em si dizia logo no começo que ela não queria ser inconveniente nem nada, que apenas queria expressar tal felicidade. Agradecendo a atenção que foi dada pelos amigos e conhecido em geral. Que ficou surpresa com as respostas de gente que ela não tinha contato há certo tempo. Fez todo um discurso dizendo sobre a importância das pessoas demonstrarem o carinho com o próximo e tudo mais. E acabou com a seguinte frase: “É inegável a importância de um gesto de carinho e afeto....

Mesmo sabendo que o e-mail não foi encaminhado somente para mim e sim para mais outras setenta e poucas pessoas, resolvi, estimulado pelo seu singelo sentimento, mandar-lhe uma resposta. Disse a verdade. Que nunca lia o que ela mandava, não só para mim como para as outras setenta e poucas pessoas, mas que dessa vez não tinha passado em branco. Deixei bem claro minha intenção, que foi somente me expressar depois de ficar surpreso com um e-mail tão gentil. Assim mandei-lhe. De vez em quando a gente fica meio fraco, meio estranho.

Acabei adiando alguns dias minha ida. No decorrer desses dias não obtive nenhum retorno. Talvez ela não tenha visto. Acho que ela não teve tempo. Ou até mesmo ela tenha feito o mesmo que eu sempre fazia, simplesmente apagou. Não sabia, mas era fato que eu esperava uma resposta.

Peguei minha mala, fechei o zíper e bati a poeira sobre ela. Antes mesmo de sair ainda fiquei curioso e fui dar uma olhada rápida. Mensagem do banco, anúncios fúteis e um de cobrança, mas nada dela. Sorri e coloquei meus pés para fora de casa. Desta vez andava um pouco mais satisfeito comigo sabendo que a esperança ainda corria solta por aí.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Keep Walking

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Peguei alguns trocados que estavam espalhados pela gaveta e conferi. Havia dezessete reais e mais alguns centavos que tive folga de contar. Com o dinheiro decidi comprar um livro no sebo próximo de casa para passar o tempo nas horas vagas. As horas que ultimamente andavam vagas demais. No caminho eu pensava e falava sozinho, sempre tentando transformar tudo à minha volta em uma grande piada. Algumas sacadas que eu imagino são tão boas que freqüentemente eu solto um sorriso discreto para mim mesmo.

Eu levanto e durmo com medo de virar uma simples estatística em meio a tantos imbecis. Desde aquele que acha que muda o mundo dando esmolas, até aquele que acaba de desmamar em plena faculdade e acha que entende de política, gritando e discutindo com um copo de cerveja na mão a situação de nosso país. Para esse tipo de indivíduo dê-lhe os ouvidos da razão e o desprezo do silêncio.

Lá estava na minha mesa dezenas de papéis rabiscados cuja inspiração era sempre voltada para noites frias, solitárias e silenciosas. Eu me encontrava novamente em uma noite de inspiração, não sei nem mesmo dizer se é por escolha própria ou não. Conferindo alguns trechos que escrevi em diversos papéis, tentei bolar um parágrafo que fugisse do convencional, do julgamento fora de controle.

Quando a fase não é boa praticamente não existe espaço para belos pensamentos. E fugir do convencional poderia ser tornar mais perigoso do que se pode imaginar. Não quis arriscar escrever algo sem sentimento algum.

Peguei então o livro e li rapidamente em duas noites. Havia comprado o livro certo na hora errada. Isso me custou uma semana de insônia.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Almas de cristal

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Ainda podia se recordar quando olhava as nuvens ao seu redor do quanto o mundo estava diferente. Talvez, antigamente, estivesse mais preparado ou simplesmente não conseguia mais se adequar as mudanças que aconteciam a sua volta.

Nascera rico, sempre tivera grandes amigos e sua família nenhuma vez abdicara de amá-lo. Não lhe faltavam paixões e tinha a imensa habilidade de nunca falhar. Não porque se esforçasse para se eternizar como uma mente brilhante, mas, sem nenhum esforço e dedicação, conseguia mostrar ao mundo que nada era impossível não importasse o que pretendia ter, fazer ou conquistar.

O mundo que vivemos é diferente para cada um de nós. Todo o sucesso, fama e valor já não faziam mais sentido. Possivelmente nunca haviam feito. Rodeado de luxo não podia ser mais solitário. Por mais mulheres que conquistasse, seu coração não ardia mais. E independente do quão competente e conhecedor do mundo fosse, não lhe abandonava a idéia que fosse o mais pobre ser entre todos nesta terra.

Contentava-se apenas em conversar com o querido beija-flor que todos os dias lhe fazia uma pequena visita ao seu imenso jardim. Passava horas na frente do espelho e já não acreditava mais no que o reflexo lhe respondia. Passou a fazer brincadeiras sem sentido e a fingir que seu coração partido e sua alma sem convicção eram apenas um brinquedo quebrado largado ao longo da estrada.

Começou a colecionar armas e a enganar os que se preocupavam com sua nova reputação. Seu confidente o aconselhava a acabar logo com tudo, mas no fundo sabia que lhe faltava coragem. Em um desses longos monólogos, passou sete horas em frente ao espelho com um revolver calibre trinta e oito apontado para sua têmpora. Fazia piadas e se divertia com algo que somente ele seria capaz de explicar. Num certo momento se deu conta que já estava exausto de tudo aquilo e que chegava a hora de descansar. Simplesmente apertou o gatilho. O corpo caiu imóvel ao chão. Ainda sorria. O espelho refletia, agora no meio do caos, o sangue que escorria por todo o quarto e a silhueta sombria de uma alma vazia e inconsolável.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Um suspiro dos céus

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Estava sentado em um bar na beira da estrada. Era simples, mas belo. O ambiente era convidativo e o balcão possuía um vitrô raso e sensível que não deixava as gotas e bebidas atingirem a madeira. Não havia ninguém além de minha pessoa e o balconista que me servia. Ouvia apenas o som dos pratos e copos que eram lavados na cozinha e aos poucos bebericava meu whisky olhando a mim mesmo no reflexo do espelho das estantes que acomodavam as garrafas.

Durante o terceiro gole, escutei o ranger da porta. Virei-me e fiquei paralisado. Uma linda mulher entrou suavemente e se dirigiu até o balcão em passo lentos, diretos e sensuais. Não tirei meus olhos dela até que se sentasse. Não apenas porque o som havia me chamado a atenção, mas porque sua beleza tornava este ato impossível. Sentou-se ao meu lado esquerdo a alguns bancos de distância. Ruiva e com os cabelos lisos que fluíam sem devaneios até o meio das costas. Olhos azuis. Um corpo estonteante e um andar simplório que lhe transformava em uma figura mágica. A forma como se portava era invejável e, sem que eu percebesse, acabou me hipnotizando.

Não sabia o que fazer, mas tinha certeza que não podia deixar aquela chance passar. Chamei o garçom e pedi que servisse a linda moça uma taça do vinho tinto mais saboroso e suave que existia naquele bar. Quis acreditar que o vinho fosse algo que apreciasse. Um terrível engano. Ofereci-lhe um brinde. Levantei meu copo e a cumprimentei. Ela fingiu que não viu o meu gesto ou talvez sua imponência fosse tão grande que realmente não tenha reparado ou, sequer, percebido que eu estivesse ali. Mais um passo em falso.

Levantei-me e me sentei ao seu lado. Disse um olá um pouco sem graça e dei mais um gole no meu copo. Ela apenas pegou sua taça e levemente a levou aos lábios. Tentei uma vez mais. E novamente ela não me respondeu. Sequer virou-se para me olhar. Minhas tentativas estavam indo de mal a pior. Ela estava com o rosto virado para o lado oposto ao meu. Observando algo que ainda não conseguia ver ou sentir esperando apenas que eu desistisse e voltasse ao meu solitário mundo.

Aproximei meu rosto de seu ouvido. Podia sentir o seu perfume. Um aroma leve, livre e adocicado. Seu cabelo, macio como seda, refletia a luz do final do entardecer que entrava sorrateiramente pela janela. Sussurrei com calma e veemência. Disse a ela o quanto estava linda e quão importante era sua presença naquele lugar, que o transformava, por pequenos instantes, em um local divino justamente por ela ter, um dia, passado por lá. Lembrei-a do quanto era belo e cativante a forma como arrumava o seu cabelo e principalmente o modo misterioso e sereno que levava a taça até a boca. Uma beldade tentando convencer a si mesma de que ainda tinha cartas na manga para mostrar que podia ser mais exuberante e inesquecível do que o habitual, mesmo que para nós, meros admiradores, parecesse impossível. Por último, tentei recordá-la do quão incrível havia sido o momento em que ela havia dado o primeiro passo através da porta em direção ao balcão. O tempo havia parado por um segundo e o universo inteiro havia deixado de cumprir suas obrigações somente para poder observá-la. Afinal, poderia ser a última chance que teríamos para contemplar algo tão maravilhoso.

Pouco a pouco, voltei a minhas obrigações e deixei de importuná-la, pois não havia dito nada a ela que já não estivesse cansada de saber. Sem mais opções, aguardei para ver se minha última cartada faria algum efeito. Uma melodia suave soou em meu ouvidos e senti um leve movimento vindo de sua parte. Ela se virou carinhosamente em minha direção. Ficamos frente a frente. Por um segundo, não tive certeza do que aconteceria e um calafrio intenso cobriu todo meu corpo. Olhei no fundo de seus lindos olhos. O azul incansável dominava completamente meus pensamentos e seus olhos brilhavam intensamente. Mais belos e vivos que o último raio de luz que um cristal despedaçando pelo assoalho poderia refletir.

Sem que percebesse, nossos lábios ficaram cada vez mais próximos. Uma aura púrpura nos cobriu e, em um momento mágico, nos beijamos. Não tinha certeza sobre o que havia acontecido. Uma chuva de sentimentos e um alívio intenso tomou conta de mim. Nunca havia sentido nada igual e nunca mais conseguiria senti-lo. Uma sensação única e inexplicável que me fez pensar que, por um momento, poderia conseguir tudo o que quisesse nesse mundo sem ao menos me esforçar. Nunca mais me esqueceria. Nunca mais.

Um copo veio ao chão e se estilhaçou em pedaços. O barulho dos cacos se espalhando pelo bar foram ficando cada vez mais altos e ensurdecedores até que fui obrigado e me esquivar e proteger os ouvidos. Uma explosão silenciosa aconteceu e uma luz branca e intensa me obrigou a fechar os olhos. Não podia enxergar e nem mesmo ouvir o que acontecia a minha volta, mas aos poucos o barulho e a luz foram diminuindo até que nada mais me incomodasse. Quando abri os olhos estava em um campo aberto que abrigava apenas uma grande arvore em seu centro. Olhei em volta e não havia mais nada além da grama ao vento e das montanhas nevadas que ficavam a alguns quilômetros de distância. O tempo estava agradável e podia sentir uma leve brisa que animava o entardecer. Andei até a isolada arvore e sentei-me para apreciar as cores vibrantes do céu que somente o por do sol é capaz de nos propiciar e mais um dia em minha vida chegava ao seu fim. Mais um dia.

domingo, 12 de julho de 2009

Sociedade

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Discutíamos um assunto sobre sorte ou azar em plena terça-feira de um dia ensolarado. Sentar no bar e tomar cerveja em uma das mesas da calçada tinha sido uma ótima escolha. O dia estava propício para isso.

Havia um certo conflito na opinião de cada um, parecia não ter nenhuma maneira de entrarmos em um acordo. Em meio há gritaria e discussões, foquei meu olhar para uma garota que passara correndo exatamente na nossa frente. Com uma saia indiana, chinelo rasteiro e o cabelo preso com um lápis ela corria. Sua bolsa pulava de um lado para o outro, e com livros na mão foi em direção ao ônibus para alcançá-lo. Sua beleza talvez tivesse ficado em segundo plano. Correu e seu esforço foi recompensado.

“Só mulher gente boa corre atrás de ônibus, não tem como negar que ela ganhou alguns pontos positivos”, alguém falou. Tinha pensado exatamente a mesma coisa. Expressei minha opinião dizendo que tinha concordado com sua idéia e o assunto morreu por aí. Simplesmente ela passou e eu fiquei. Assim são alguns trechos mal escritos na nossa vida.

Passamos metade da nossa vida com a cabeça encostada no travesseiro. Reclamando daquilo que estamos fazendo, que vamos fazer ou que deixamos fazer. Grande maioria é facilmente manipulada por conceitos alheios e cada vez mais deixam de expressar suas opiniões.

Acabei minha cerveja e despedi-me de todos na mesa. Era hora de se retirar e tocar minha vida. O vento não ajuda a empurrar quem prefere ficar parado. Passam-se os dias e eu ainda não consigo me acostumar com determinado fatos. Eu realmente não nasci para agradar os conceitos da sociedade.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Uma forma triste para dizer adeus

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É verdade que fiquei um pouco ausente nos últimos dias, meses e anos. Não porque era essa a minha intenção, mas, porque, apesar de nunca estar fazendo nada, acabo sempre fazendo tudo ao mesmo tempo.

Deitado na cama, conseguia avistar um pássaro cinzento de penas brancas isolado no parapeito de minha janela. Sozinho e contemplando sua imensa solidão, ele ficava imóvel, talvez refletindo sobre o que havia feito de realmente importante em sua vida e recordando os sentimentos que não mais o aqueciam e, que agora, apenas lhe deixavam um vazio obscuro em seu coração. Talvez. Mas nunca saberemos o que um animal livre e solitário como esse poderia estar realmente sentindo.

Mesmo perdendo alguns minutos a observar, cheguei a conclusão que me senti um pouco mais alegre e com alguma inveja de sua imponência. A sensibilidade em meus ouvidos estava cada vez maior e já conseguia ouvir os risos das crianças que brincavam na esquina a vários metros de distância. Os risos se aproximavam e o pequeno pássaro, atento, observava o mundo enquanto, em pequenos lampejos, enfiava graciosamente o bico entre as asas uma vez ou outra para quebrar o tédio. Os risos continuavam e estavam cada vez mais perto. Cessaram exatamente embaixo de minha janela. Peguei o violão e dedilhei algumas notas. O pássaro de penas brancas finalmente quebrou sua postura e virou-se em minha direção. Olhou-me e grunhiu de uma forma tão sincera que pude sentir que estava me dizendo adeus. Mas por que comigo? Por que naquele momento e daquela forma?

Ouvi apenas um tiro. O violão caiu de minhas mãos e o pássaro havia sido perfurado por uma minúscula bala de chumbo em seu pescoço. Sua cabeça titubeou com o impacto e ficou dependurada. Os olhos ainda abertos, mas já imóveis não demonstravam mais nenhum sinal de vida. O pequeno animal já não era completamente cinza e suas penas brancas, agora, estavam manchadas pelo seu próprio sangue e pela crueldade de uma criança que apenas queria se divertir. Ele girou e caiu para o chão como uma estrela cadente em seus últimos segundos de brilho e aterrissou ao chão no mesmo instante em que o violão se debateu contra o assoalho. Já não estava mais entre nós.

Corri para a janela, com uma raiva que jamais havia sentido. Tinha perdido algo dentro de mim, mas ainda não sabia o que era e que ainda, apesar dos anos, não descobri o que foi. Um grupo com cinco garotos riam e se exaltavam com o feito. No meio deles um garoto loiro, bem vestido e com uma arma na mão. Era o líder e o autor do crime. Olhei diretamente em seus olhos azuis e consegui sentir a maldade em suas intenções. Possuía um sorriso malicioso e perverso. Senti um calafrio me percorrer a espinha. Estava com vergonha do ser humano e por pertencer a mesma raça daquele franzino menino. Há quem diga que possamos ver Deus no resto de uma inocente criança, mas não estava preparado para encarar um pequeno demônio de frente. Ele se virou e andou lentamente até dobrar a esquina. Seus capachos se apressaram e o seguiram sem pestanejar. Foi a última vez que os vi na rua, mas ainda posso ouvir claramente os risos ecoando.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Confinamento - Final

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No dia seguinte retomei o que estava fazendo. Cada dia que passava se tornava mais difícil terminar a carta. Sabia que ainda iria tomar uma rasteira da minha compaixão. Infelizmente ainda continuo preso aqui. Achei que seria necessário limpar novamente a poeira sobre os livros. “Tinha uma vida dupla? Ou uma dupla personalidade?”. Antes mesmo de continuar peguei um livro na estante, na esperança de achar algum que eu não tenha lido no mínimo três vezes. Eu ainda continuo preso aqui.

Entre os preferidos estavam muitos romances. Romance é muito mais do que escrever, não é uma fábula inventada por qualquer um apenas para entreter, é algo que precisa ser sentido, vivido. Tinha me perdido nessa matéria, cheguei atrasado, cabulei demais. Peguei a caneta em minhas mãos e escrevi na folha:

“Resumindo a conversa de muitos assuntos e poucas palavras. De repente eu assisto, novamente, tudo por cima do muro. Eu deixei de temer meus medos, só que nunca deixei de respeitá-los. Mudando um pouco de assunto, não sei se você gosta de Bob Dylan. Comecei a ouvir bastante e agora prestei um pouco mais de atenção nas letras. Sabe, às vezes, em uma fase qualquer algumas bandas tornam-se trilha sonora do nosso dia-a-dia.”

“Cansei meu amigo. Cansei de ter razão. Cansei de ser incompreendido. Cansei de estar sempre na linha de tiro e estar sempre com a cabeça erguida. Talvez o único que se manifestava na hora ruim, sem qualquer pensamento esperando um favor em troca. Quantas vezes omiti a verdade e sofri as conseqüências com isso. Que inconseqüente não acha?! Ser o alvo principal apenas para manter o ciclo de amizade. Que ironia, talvez agora eu veja que nem todos merecem meu sacrifício. Cansei de ser o coringa do baralho, de ser uma sombra no escuro. Já foi tempo que fui humilhado e me humilhei. Minhas poucas palavras são apenas uma pequena parte de minha defesa. As suas talvez eu seja o que mais saiba e o que menos compreende.”

“O confinamento ainda continua e eu infelizmente ainda estou preso aqui. Só que nesse tempo superei um medo. Possivelmente sim ou talvez até não. Nunca achei que seria necessário passar por isso, só que estou cansado demais. Não foi culpa minha outra vez, não busquei superá-lo, simplesmente aconteceu. Superei o medo de perder amigos.”



Confinado há exatos 7 meses, 23 dias e algumas horas.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Confinamento 2º Parte

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Havia manchado toda minha mesa, já deve ser a segunda ou terceira vez que isso acontecia. Era um hábito escrever no papel e depois passar para o computador. Reuni tudo em volta e organizei, sabendo que minutos depois estaria em total bagunça novamente. Como todo bom mortal, em um momento de inspiração, resolvi por um minuto descer até a banca para comprar o jornal diário. Desta vez optei pelo de esportes, não estava com paz de espírito para ler sobre notícias ruins, eu já falava demais por elas. Cumprimentei o zelador, o porteiro, a síndica e a faxineira. Era outro hábito ser humilde também.

As pessoas de casa tornaram-se um pouco vazias para mim, mas nunca deixei de amá-los. Eu estava somente na minha fase onde você torna-se desconhecido de si próprio. Achava que certas crises, fases ou como qualquer definição desse tipo acontecia somente com os outros. Me enganei, e quando percebi já estava envolvido nela por inteiro.

Situações é que fortalecem os homens, sem crise, jamais seriamos quem somos hoje. Desempregado, roupas em total desgaste, bloqueio da conta no banco, refeições sem mistura, telefone somente recebendo ligações e morando de favor. Podia-se dizer de passagem que não era uma das melhores situações. Apesar de tudo isso talvez não houvesse motivo para se reclamar ainda. Esqueci tudo e voltei ao papel e caneta.

Descobri que costumo escrever como eu penso, sem colocar ou tirar nenhuma palavra. Interessante não?! - Poucas vezes tenho que reformular a frase que escrevo. Parece que sempre sai completa da maneira como eu gosto, mas não vêem ao caso agora não é mesmo?! – Mas voltando para nossas realidades, apenas queria te dizer algumas palavras só. Nunca escondi que de fato minha preferência foi sempre ser pessoalmente. Mas como não há outro jeito, tento dessa maneira.”

“Pior do que qualquer agressão física, a maior de todas as dores é a da vergonha. E de um amigo tão querido não só é uma surpresa como vira uma rachadura dentro da alma. Sempre achava que seus erros eram involuntários. Mas de repente andou se tornando freqüente demais, e por motivos menores ainda. Sabe amigo, a maioria das pessoas que a gente tem contato pelo menos uma vez falaram como agüento tal desaforo. Eu não agüento, eu simplesmente esqueço.”

Decidi então parar. Levantei-me e fui tomar um banho. Tem dias que nem tudo merece ser escrito como realmente é.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Confinamento 1º parte

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Como a coluna dói... como os pés formigam... como a vida passa quando você tem todo o tempo para observa – lá. Isso mesmo, ao invés de estar gastando-a, ocupando-a, eu apenas ando só observando-a. É passageiro, disso tenho certeza. É que faz um determinado tempo que estou confinado aqui e desconheço a razão. Muitas vezes está tão claro que chaga a incomodar os olhos. Só que surgem determinados momentos que fica tão escuro e silencioso que imagino se lá fora alguém ainda lembra-se de mim. Já li e reli tudo que tinha aqui dentro. Eram livros, revistas, jornais, capas de cd’s, rótulo de garrafa, caixa de sapato, documentos velhos, caixa de papelão e até mesmo encarte de vinil.

O telefone ainda anda quieto demais. Pego ele, dá linha, não consigo discar. Quando toca, não posso atender. Uma obsessão e uma calma estavam tomando conta do lugar. Estávamos no mesmo ambiente eu, a jovem ansiedade, a velha angústia, a pequena destreza e a senhora esperança. Cansado de lidar com os lobos?! Alguém havia dito, colocando em pauta o assunto. A sacada do mundo moderno se encarrega de tomar conta da sua ironia. Quantas pessoas volúveis! – novamente falaram quando o momento era de silêncio. Então escrevi:

“Escrevo novamente por meio dessa para dizer como estou triste com sua atitude. Te pedi para olhar para minha cara e dizer o motivo de sua raiva sobre a minha rebeldia. Sabe velho amigo, meu impulso de parecer desrespeitar sempre sua opinião na verdade era de poupá-lo de certos importunos que cabia a minha pessoa resolver. Mas veja bem, somos amigos ou patrão e encarregado? – Desculpe a maneira de como lhe digo mas não havia outro jeito de falar. Muitas vezes tive que passar vergonha para dizer que tais palavras contras você era mentira, e a fama vinha novamente bater na minha porta. Mereci algumas confesso para você, só que infelizmente as maiores não tive sequer uma chance de me defender. O olhar de desconfiança já tomava conta do ambiente que tinha como uma segunda família, e ainda...”

Estourou a tinta da caneta...

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Virtude de um cão

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Acordar em uma manhã completamente tomada pelo sol, vindo de uma noite mal dormida e ainda por cima com tal ressaca, somente para levar meu cachorro para passear não estava sendo um jeito agradável de começar meu domingo. Depois de lutar incansavelmente contra todas minhas vontades tive que levar meu cão para seu passeio, contrariado. Olhei para cara do meu cachorro e senti certo arrependimento de minha decisão há alguns minutos atrás. Ele, posso até dizer com certa afirmação, sabia que dependia da vontade de alguém em casa para ele ter seus 60 minutos de caminhada prazerosa no fim de semana. Não podia culpá-lo por nada, errado estava minha pessoa de confrontar sua pequena vontade.

Mukeka! Assim o chamo e por um instante ri de seu nome. Acho que ele não liga para esse nome. Cachorros em geral não devem ligar para seus respectivos nomes. Nenhuma nuvem no céu chamou minha atenção, o dia estava limpo, não estava propício para escrever uma critica sequer. Resolvi então deixar as mágoas um pouco de lado, havia sempre muitas a serem discutidas, mas as respostas de todas elas quando o culpado parece não ser você ainda se encontravam longe demais para serem esclarecidas. Ao longo de minha caminhada sentia-me bem, e meu cão entrou em uma certa sintonia com o meu bem-estar, estava feliz também. A nova fase onde tudo é viável só que a renda não corresponde às minhas vontades era outro fator que devia ser um pouco esquecido naqueles 60 minutos.

Passei por um muro que tinha a seguinte frase – “O mundo precisa de amor. Porra!” – O quê passa na cabeça de um sujeito desse, pensei. Ele simplesmente escreve uma singela frase com uma mensagem que mereça uma atenção, talvez, e acaba por fazer ela se torna um tanto que ridícula no final. Tantas novas gerações aparecem todos os dias que me deixa confuso classificar quem é quem, hoje não tenho idéia de quem senta ao meu lado. Não julgo mais porque aprendi a ouvir, e todos merecem essa chance.

Na rua com meu cão existiam dois tipos de pessoas, as que evitavam contato direto com ele, por isso preferiam atravessar a rua, e as que sorriam para ele. Senti uma ponta de inveja, era temido ou amado sem ao menos se comunicar, sem qualquer espécie de diálogo. Dei-lhe uma leve tapa no seu traseiro e fiz um carinho na sua cabeça sorrindo. Não era o cão e seu dono, e sim o cão e seu amigo.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

The Masterplan


Havia decidido, antes mesmo de parar um minuto para pensar, que não faria mais nada para apressar o meu dia ou fazer dele apenas mais um outro no meio dessa longínqua semana. Tentei ser sincero comigo mesmo e percebi que nem com a minha própria pessoa tenho facilidade em mostrar o que realmente sou. O telefone tocou e decidi voltar ao mundo real. Troquei emails durante algum tempo, conheci novas pessoas e reparei que o sol tem um brilho diferente a cada novo dia. Quando me dei conta, já me encontrava em uma situação que não acontecia há um bom tempo.

O carro parado em frente ao seu prédio e um último suspiro de coragem para que a noite pudesse correr sem nenhum problema. Desci do automóvel e a vi saindo pela porta da frente. Ela estava linda e se vestia muito bem. Mulheres bem vestidas ganham muitos pontos ao olhar de um homem maduro, principalmente em um mundo onde, hoje em dia, a vulgaridade se tornou algo comum.  Com um leve cumprimento a elogiei pela sua grande beleza e a acompanhei até a porta do passageiro. Abri e a convidei a entrar.

A noite parecia perfeita e a conversa fluía melhor e mais agradável do que eu poderia imaginar. Fomos a um PUB esperar um pouco antes que o evento começasse. Os irmãos Gallaghers estavam na cidade e isso significava egocentrismo, baladas e rock and roll. Oasis é uma de minhas bandas favoritas e independentemente do que fosse acontecer durante aquela noite, algo de muito bom ainda teria de ser aproveitado.

Descobrindo um pouco mais sobre cada um de nós, não vimos o tempo passar e quando nos demos conta já estávamos atrasados para o show. Apressamos-nos e saímos pela porta do bar. Um grande temporal tomava conta da cidade. Chuva é algo comum quando o Oasis está por aqui. Toda vez que os odiosos ingleses tocam, o céu resolve desabar e espalhar suas mágoas por toda a metrópole.

Preparei-me para correr e ela, em um gesto singelo, não me deixou que buscasse o carro e a encontrasse na entrada do local para que não se molhasse. Abraçamos-nos, os e fomos passo a passo andando em direção ao estacionamento com o seu casaco perfumado estendido sobre nossas cabeças. É engraçado como podemos nos lembrar de algumas sensações sem que nos esforcemos para isso.

No caminho até o show, nos encontrávamos lado a lado e me impressionava muito o modo sincero e carinhoso como ela sorria. Quando percebi que a aglomeração de pessoas passava a ser cada vez maior, aproximei minhas mãos das dela e um as segurei com muito cuidado. Um gesto recíproco vindo de sua parte, deu-me coragem para prosseguir. Pouco a pouco fomos nos aproximando. Podia sentir a harmonia que se espalhava pelo local e a música já se infiltrava com todo o poder e exaltação em meu coração. Quando chegamos a pista, o show de luzes nos abraçava e nos convidava e ficar cada vez mais próximos. Os primeiros acordes de ‘The Masterplan’ começaram a soar. Virei-me em sua direção e a puxei delicadamente pelas mãos. Vagarosamente me aproximei de seu rosto. Podia sentir o calor de seu corpo e quando menos percebi, um caloroso beijo nos foi agraciado. Um momento simples e, ao mesmo tempo, mágico. A partir dali, não precisaríamos de mais nada para que tudo continuasse bem.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Lançamento do livro "Uma simples Carta"

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Após um bom tempo escrevendo por aqui, tenho a honra de convidar a todos para o lançamento de meu primeiro livro. Um romance autobigráfico chamado 'Uma Simples Carta' no dia 12/05 (terça- feira) às 2oh no Bar Restaurante Central das Artes. A entrada é franca.
Obrigado a todos e sejam bem vindos.

Central das Artes - Rua Apinagés, 1081 (próximo a MTV)  
Tel:3865-4165
12/05/2009 (terça-feira)
20:00 horas
Entrada Franca



Uma Simples Carta
Thiago Gacciona
Romace
124 páginas
Editora Biblioteca 24x7

Sinopse: O que faria um garoto estando pela primeira vez no exterior e acabasse se apaixonando por uma linda mulher casada e conseguisse a impossível chance de se envolver em uma viagem emocional sem precedentes?
Um jovem de vinte e dois anos busca incansavelmente uma chance para poder viver a maior experiência sentimental de sua vida. Ótimas passagens de humor, personagens cativantes e acontecimentos surpreendentes, te transportam a uma viagem fantástica e emocionante pela romântica Itália. 
Uma história real que retrata um país europeu de primeiro mundo pelos olhos de um garoto apaixonado.


terça-feira, 28 de abril de 2009

Plano de seguimento 2º Parte

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“Fique à vontade – disse. E depois retirou-se.” Foi a última frase que conseguiu escrever no dia. Foi até sua cozinha para tomar um copo d’água e comer algo para enganar um pouco o estômago. Abriu a geladeira e encontrou “o quase vazio”. De encontro com “ele” novamente – pensou. Caminhou até sua sala e pegou telefone, seguido por um rápido olhar até o calendário. Dia 12, 05h03min PM. Ninguém atendeu. Sentou novamente sobre sua cadeira e afogou-se em sua bagunça, entre ela papéis e livros. Coçou a barba, que por sinal encontrava-se em um estado avançado de seu crescimento, e lutava para bolar alguma idéia criativa para desenvolver seu novo personagem.

Havia uma crise existencial entre o autor e o personagem. Podia ele corrigir seus maiores erros dentro de seu personagem, no entanto cometeria um erro fazendo isso. Puxou um papel e enumerou em duas fileiras suas qualidades e seus defeitos. Não ficou surpreso, havia muito mais defeitos do que às próprias qualidades. Tinha em mãos um personagem tão obscuro quanto ele, e pensava o quanto seria complicado para algumas, ou certamente para maioria, entender um personagem assim como ele. “Dificilmente descobrimos quem somos, imagina então para que viemos.” – Refletiu.

No caderno havia tantos rabiscos espalhados pelas páginas inteiras, tudo em diversas posições e tamanhos diferentes. Todo mundo tem sempre uma mania estranha, a dele podia ser essa, mas a de um gênio é aquele que sonha e acorda de madrugada somente para anota-lo. Procurava então uma próxima música, acabou optando por um Blues. Suspirou e enfim teve tempo de escrever mais algumas palavras...

sábado, 18 de abril de 2009

Por entre as grades da janela

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O mundo se transforma em um lugar muito melhor após o anoitecer. Principalmente depois que aprendemos a viver no constante exagero da vida jovem que nos mata pouco a pouco sem que demos ao corpo ao menos uma chance para nos mostrar o quão errado está o caminho que sentimos prazer em seguir. Pessoas importantes sucumbiram diante disso e uma infinidade muito maior, que nunca sequer saberemos quem foram, também. Para dizer a verdade, sinto bastante falta da minha infância.

Em alguma dessas noites, poderia muito bem contar que o mundo girava a minha volta. Era livre, engraçado, chamava a atenção e sabia que o sorriso não fugiria nunca de meu rosto. Amigos, amores ­­ – correspondidos ou não ­–, brincadeiras, brigas, verdades, mentiras, músicas, sorrisos, carinhos e abraços. Tenho muita sorte em afirmar que a felicidade sempre caminhou comigo lado a lado.

Agora, sentado e tentado escrever, não poderia deixar de ser tão sincero. Vejo os raios do sol de uma maneira diferente, mais vivos, belos e radiantes. O céu, limpo e ciano, nunca esteve tão azul. Uma brisa refrescante passa por minha silhueta e sussurra ao meu ouvido: “Não importa o que deseje, você não poderia estar em melhores condições.”

Não sinto frio nem calor, apenas o vento suave e sereno me pedindo para que flutue com ele por alguns instantes. Uma linda garota, de cabelos loiros e presos, passa pelo outro lado da calçada, falando ao celular e desfilando sua admirável beleza, com um sorriso inesquecível em seu vagaroso andar, passos lentos e aconchegantes como se fosse a noiva indo de encontro ao altar realizando o sonho de menina. Se tivesse a oportunidade para vê-la de frente, poderia jurar que uma lágrima está prestes a escorrer por seu maravilhoso rosto. Apaixonei-me em uma fração de segundos, mas já estarei livre assim que ela dobrar a esquina.
As arvores não estão com tantas folhas assim e só posso ouvir pequenos pássaros a cantar. Um amigo disse-me que o outono havia chegado e só me dei conta da verdade neste exato momento. Nunca havia percebido que sinto prazer ao ouvir o som dos carros deslizando pelo asfalto.

Tudo isso ouvindo One Day It Will Please Us To Remember Even This(New York Dolls). A um primeiro momento, pode lhe parecer estranho e que não seria uma trilha sonora selecionada com cautela, mas se tiver a chance de fazer o que está me entretendo, verá o quão verdadeiro estou sendo em minhas palavras. Acho que nunca estive tão certo em toda a minha vida e a satisfação em seu rosto lhe dará provas de que por menor e menos significantes que sejam alguns momentos, a vida pode ser muito melhor do que tudo que esperamos dela.

Vou me esforçar para voltar ao mundo real. Ainda é cedo e o feriado mal começou. Acho que sou uma pessoa fácil de entreter. Não espero muito do mundo. Deve ser por isso que estou sempre feliz. Tentarei passar isso adiante, mas o ser humano não é um animal simples de convencer. Gostaria de continuar agora, mas não quero me cansar, nem a mim nem a todos vocês. Voltarei um dia e estarei os aguardando com um imenso prazer. Até.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Plano de seguimento

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Seguia ele escrevendo um roteiro de viagem para dentro do seu quarto. Roteiro de viagem para dentro do seu quarto? Quem imaginara tal loucura ele se perguntava. Uma vez conversou com seu próprio reflexo, entre uma conversa ou outra chegaram à conclusão que ambos pensavam diferentes.

Quanto tempo estou preso nesse quarto? Dias? Meses? Pela sujeira acumulada nas lentes do meu óculos acho que não parece tanto assim. Fome? Sinto de vez em quando, aprendi a conviver tomando um pouco de água e comendo alguma tranqueira qualquer. Ah que bela musica toca no rádio, uma pena eu não saber o nome nem o autor dela. Com certeza ela será tocada uma outra vez, pois é uma bela canção.

Chovia tanto lá fora que o vento parecia querer arrebentar sua janela. Teve que parar no meio da sua inspiração para colocar alguns panos para pararem de tremer. Olhou para a rua e viu as pessoas correrem, mas desta vez não se importou tanto em observar elas lá fora, havia se cansado um pouco disso talvez. Pegou uma caixa e abriu, tinha tantos sonhos lá dentro que se pôs a sorrir, felicidade andava com ele novamente.

Calçou seu par de meias furada junto com seu tênis quase sem sola. Seu bom humor, de tão contagiante que estava, achou engraçado sua situação. Sentia-se cansado, mas não fazia idéia do motivo pela qual encontrava-se diante de tanta fadiga. Não parava quieto e não conseguia ouvir uma música inteira. Caminhou até o banheiro e lavou seu rosto, ao subir deu de cara com seu reflexo em meio ao espelho. Outra discussão? Arriscou um sorriso e foi recebido com o mesmo gesto. Enfim, seu reflexo e o bom homem haviam concordado depois de um longo tempo.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Frases


Seria ótimo poder controlar minhas emoções. Quando isso acontecer sei que o seu sorriso me levará ao fracasso total.”

“Tenho bastante curiosidade para saber o que, na verdade, os cães pensam.”

“Comecei a prestar mais atenção ao movimento nas ruas e percebi que não vale nem um pouco a pena perder tempo se preocupando.”

“Algumas vezes tenho um pouco de trabalho para conseguir sonhar.”

“Foi triste quando fiz aqueles que amava chorarem, mas foi ainda pior quando minhas lágrimas caíram por culpa de outra pessoa.”

“É muito triste lembrar que existem pessoas surdas pelo mundo.”

“Algumas experiências mudaram minhas visões sobre conceitos que eu havia formado e, dependendo de nosso estado, percebi que certas atitudes do mundo começam a fazer sentido.”

“Algumas vezes tento, mas mudar o mundo parece ser uma tarefa impossível.”

É engraçado que podemos ser íntimos sem que nunca tivéssemos trocado uma frase sequer e que podemos nos deixar levar por um desejo carnal que, como homens, não conseguimos controlar.”

Somente a ira distrai o medo dos desesperados.”

“As grandes tragédias mobilizam o povo e o povo se culpa pelas tragédias da sociedade.”

“É necessária uma grande batalha contra si mesmo para se dar conta da inútil realidade.”

“Tudo possui um significado diferente quando temos no que acreditar.”

“Muitas vezes penso que sou mais inteligente do que pareço e na maioria das vezes me mostro mais idiota do que deveria.”

“Esquecer, algumas vezes, é muito mais difícil do que tentar recordar aquilo que não lembramos mais.”

quinta-feira, 26 de março de 2009

Poeta sonhador

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Chegou ao topo do mundo e pôs-se a gritar, indignado com suas preocupações. Era seu único recado depois de tanto tempo em silêncio. Estava preocupando muitas pessoas à sua volta, estava agora ficando quieto e fugindo de seus compromissos. Estava cansado de tantos julgamentos? Estava conturbado porque errava demais? Deixava escapar aquilo que tinha que ser mantido guardado?

Preocupou-se em brincar com o eco, sobre a saudação de um vento vadio qualquer sentava e sorria por nada, por nenhum motivo, estava apenas sendo um pouco feliz consigo mesmo. Despediu-se do verão e cumprimentou calorosamente o outono, era um homem livre afinal. Uma pessoa simples, agradecendo todos por sua companhia e fazendo por merecer. Suas costas andavam doloridas mesmo assim conseguiu adormecer, sonhava com crianças ao seu redor, que brincavam e sorriam com ele. Era um sujeito que irá adotar uma criança quando estiver com uma renda estável.

Ficou estranho, diferente, acabaram ferindo-o demais. Levantou-se e tomou seu café, amargo e escuro, comeu seu pedaço de pão duro e se despediu. Estranhou si próprio quando sentou-se para escrever – “Que palavras tão perturbadas são essas que estou escrevendo?”

Passou a desenhar, e fazia muito bem isso. Aprofundou-se até terminá-lo por completo, não ficou muito satisfeito, faltava algo e gastou mais um pouco do seu tempo descobrindo o tal erro. Não descobriu, mas soltou um sorriso de satisfação. Ao sair na rua foi recebido pela chuva inesperadamente, olhou para cima e passou a mão sobre sua face, uma situação um tanto que agradável para ele. No jardim do poeta sonhador ainda continuava crescendo flores em todos os ramos.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Coma induzido

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Faltava energia a mais de quatro horas. A chuva não desistia de cair. Um temporal imenso que não me possibilitava nem mesmo tentar a sorte pela rua afora.

Sem muitas opções, cansei-me de ficar sozinho no escuro lutando contra o tédio interminável. Desci até a garagem. Eu, um pequeno pinscher e um ótimo vira-lata que me esperava ao lado de fora. Tenho bastante curiosidade para saber o que na verdade os cães pensam.

Abri a porta e sentei-me no banco do motorista. Liguei o som. Os animais estavam frenéticos admirando um mundo novo e inacessível, intitulado automóvel, e eu, apenas buscando uma chance para me entreter.
Frases bem escritas tocavam meu coração ao mesmo tempo em que tentava, imaginava e buscava uma forma para dar vida aos meus sonhos.  Conseguia enxergá-la claramente, mas nunca ao meu lado. É impossível lutar quando não temos mais esperanças. Onde você estava enquanto podíamos chegar mais alto?

Gostaria que adentrassem minha alma uma única vez para que pudessem sentir, viver e sonhar tudo aquilo que tento, mas não encontro um meio de dizer, mostrar ou fazer com que percebam minhas verdadeiras intenções. Podemos ser heróis por apenas um dia. Mais uma vez escuto a sua voz. Seria ótimo poder controlar minhas emoções. Quando isso acontecer sei que o seu sorriso me levará ao fracasso total.

Desligo o som. Um remédio para mim, porfavor. Levanto-me e fecho lentamente a porta do carro. Meus companheiros me seguem incansavelmente. Olho para a lua somente uma única vez. Entro e me deito na cama. Acabo de me dar conta que já está na hora de acordar.

terça-feira, 17 de março de 2009

Primeiro passo da esperança

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Nada te leva à inferioridade com exceção da sua consciência. Abuso do dia para felicidade alheia, e busco nela talvez uma gratificação para minha alma. Da felicidade tiramos a esperança, e dela o maior dos motivos para alcançar nossos objetivos. Há algum tempo que ouço a tal da história que dinheiro traz felicidade, mas onde mesmo eu encontro a felicidade para comprar?

A ambição não nos torna uma pessoa ruim, talvez se não tivéssemos nos tornaríamos fracos por falta dela. Mas o mal vem a partir do egoísmo, quando achamos que o importante é sermos ricos, com poder financeiro e status de riqueza nas costas. Algumas dores do passado me fizeram ver as pessoas de uma maneira diferente, de um jeito mais atrativo. Acho que é aquela parte que você aprecia, mas sente receio em falar, isso é um erro que vem prejudicando nosso lado humano. Parece que hoje em dia tem pessoas com medo de elogiar e sentem receio de serem criticadas. Oh humanidade com seus medos e egoísmo, mas no meio delas existe sempre alguém para sorrir, mesmo que essa pessoa não tenha nada e ao mesmo tempo possa ter tudo.

Que mundo é esse que hoje recebemos um sorriso com desconfiança, achando sempre que são segundas intenções. Pode ser que eu faça da caligrafia de uma criança uma arte, daqueles rabiscos esforçados para uma geração de novos talentos. Das histórias dos idosos que enobrece meus ouvidos, passando para frente sua experiência única, uma vida. Assim deixo um sentimento, um gesto, um carinho ou mesmo uma palavra, mas estará sempre contigo a minha esperança.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Pergunte ao vento

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Encontrava-se sentado no muro bem no meio da noite. Contemplava algumas estrelas e o céu não possuía a tal poluição, já não me impedia de ver com clareza a lua. Uma lua tão feminina quanto à brisa da manhã. Eu apenas olhava, sem nada na cabeça. Meia hora antes estava no meio da maioria de meus amigos, rindo e bebendo, estava no ambiente que mais ficava satisfeito. Decidi tomar uma dose de reflexão e fui fumar um cigarro no muro, lá tinha visão privilegiada de uma pequena parte do bairro e a montanha por inteira. A cidade grande andava deixando minha cabeça cheia de pensamentos negativos. Eu estava desempregado e sem muitos planos futuros.

Algo precisava ser feito, mas não dispunha de muitas oportunidades oferecidas, ainda quando tinha não era bem do jeito que se esperava. Uma mão me puxava para as coisas boas, mas dois pés me chutavam para o lado ruim. Sempre terei forças para segurar a mão que me guia para o lado bom, sob qualquer circunstância jamais deixarei atropelar que acho correto e humano. Lutei por muitos e talvez obtivesse sucessos em alguns. Reclamo daquilo que não tenho e agradeço por aquilo que possuo.

Cansei da mesma conversa de que eu era feliz e não sabia, talvez eu diga isso pelo resto da minha vida. Estava preste a fazer novas escolhas e desta vez não podia falhar, tudo dependia de mim mesmo e somente minha pessoa podia tomar as decisões corretas. Mais uma vez em conversa com o tempo, à qual já não possuía muito, fiz uma decisão correta. Desci do muro e voltei para a conversa, estava em mim novamente.

sexta-feira, 6 de março de 2009

O primeiro e último encontro

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O sol escaldante me fazia desistir de todos os meus planos. Era um belo, mas ao mesmo tempo, ocioso dia. Alguns inimigos haviam dado as caras e me recordado que, dependendo da situação, o dia seguinte pode não mais chegar. Comecei a prestar mais atenção ao movimento nas ruas e percebi que não vale nem um pouco a pena perder tempo se preocupando.

Quando desci do ônibus, me dei conta que o ar estava diferente. Pesado e rarefeito. Talvez um reflexo de minha alma. Perdi alguns minutos olhando o céu e depois mais alguns outros observando as garotas que se exercitavam na academia em frente ao ponto. Não importa qual seja a situação, o instinto sempre prevalece.

Parei em um daqueles decadentes bares e perdi um bom tempo jogando conversa fora, mas a cerveja já não descia mais com o mesmo gosto. Tentava descobrir o que estava errado. Em um esforço sem igual, concentrei-me ao máximo para encontrar o problema. Foi uma tentativa inútil. Dei o último gole. Uma navalha parecia cortar minha garganta. Sábia que era tudo obra de minha mente, mas o sabor do sangue me despertou.

Corri e corri pela rua atrás de algo que nem sabia o que era. Feliz e atordoado pensando em como faria para sentir aquela sensação novamente. De repente visualizei um grande lampejo de luz e pude ver aquele rosto nitidamente. Era incrível. O mundo parecia melhor por um breve momento. O tempo parou por um segundo. Ouvi uma grande freada e vários gritos de desespero. Quando me virei, só pude ver o capô do carro se aproximando. O barulho do impacto foi muito maior que a dor que deveria ter sentido. Voei como um pássaro em queda livre. Rolei pelo chão por uma quinzena de metros e parei encostado na sarjeta como um bêbado em busca de um sono tranqüilo.

Agora podia sentir o verdadeiro gosto do sangue. Dessa vez não era tão saboroso assim. A garota desceu do carro em um desespero sem igual. Chorava e, apesar do choro, conseguia manter a sua incompreensível beleza. Não podia acreditar no que meus olhos viam. Era única. Nunca havia visto nada assim tão lindo. Ela me abraçou olhando para o sangue que escorria em meu rosto. A adversidade da situação fez com aquele fosse o abraço mais sincero que já pude receber.

Sentia frio, mas estava feliz por poder estar junto dela ao menos uma vez. A dor, curiosamente, nunca chegou. Suas lágrimas pingavam em meu rosto. Agradeci pelo gesto. Sacrifiquei-me para pensar em algo bom a dizer, mas aquele não era mesmo um bom momento para ser tentar uma cantada. Os seus olhos brilharam mais uma vez. Aos poucos fui perdendo um a um os meus sentidos. Ouvir? A audição era apenas uma leve lembrança. Parei um minuto para pensar e desejei que tudo tivesse sido diferente. Queria tê-la conhecido em outra situação. Foi um enorme desperdício. Era extremamente difícil me mexer, mas consegui segurar suas pequenas mãos de fada. Aos poucos, fui fechando os olhos para nunca mais abri-los.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

O lado ruim do amor

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Estava andando pela rua pronto para entrar no prédio quando me deparei com aquela triste cena. Ele, sozinho, sentado e chorando no pé da escada que dava para a entrada da rua. As lágrimas escorriam por todo o seu rosto. Completamente frágil e desolado ele dava sinais de que alguma desgraça estava prestes a acontecer.


Dei um último trago e joguei o cigarro fora. Abri o portão e pude ouvir o silêncio pela primeira vez. Fui me aproximando lentamente. Podia sentir sua dor em cada suspiro enquanto presenciava o lado ruim do amor. Com calma, sentei- me ao seu lado.


– O que te aflige, meu amigo?

– Ela disse que já não me ama mais. – E mais uma vez as lágrimas caíram.

– Tenha calma. Essa dor um dia irá passar. Você precisa ter paciência e viver sua própria vida. Viver por você. Ser feliz por você mesmo. O mundo é ótimo e você ainda nem se deu conta disso. Respire e esqueça tudo o que te aconteceu. Levante a cabeça. Enxugue essas lágrimas e abra um sorriso, que tudo irá melhorar. Mostre a todos que não precisa de ninguém para que consiga andar com as próprias pernas. É essa a graça de tudo. Força!


Tinham terminado há mais de dois anos e ele ainda não havia superado aquela incrível perda. Já ela, nem se lembrava mais qual era o seu verdadeiro nome e ele, repetia o dela todas as noites antes de adormecer. Grande ironia.


Enquanto ele enxugava suas lágrimas, uma linda garota de olhos verdes e vivos como a lua passou pela rua abrindo o sorriso mais belo e sincero em sua direção. Ela continuou a caminhar vagarosamente pela calçada, inaugurando um caminho de flores e alegria por toda a estrada em que seguia. Chamava tanta atenção que era difícil criar coragem para conseguir uma aproximação.


– Levante- se e vá falar com ela. – Precisava, de algum modo, mostrar a ele que ainda tínhamos chances de ser feliz.


Não disse mais nada. Tirei um lenço do bolso e o obriguei a enxugar o rosto. Solenemente o ergui do chão e lhe dei um empurrão até a rua. Dei um grito e acenei para aquela inesquecível garota.  Ela nos olhou intrigada e parou. Deu dois passos em nossa direção e meu inconsolável companheiro foi trocar um par de palavras com ela.


Hoje, os dois estão juntos há mais de cinco anos. Felizes e inseparáveis. O seu nome? Eu já não me lembro mais.