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Acordei com uma dificuldade incrível para respirar. Por mais que me esforçasse, o ar dificilmente aliviava minha agonia e a cada tentativa desesperada, um chiado perturbador mostrava que algo não andava bem. Levantei-me realmente incomodado. Calcei o tênis e peguei a chave do carro. No caminho, perdi alguns minutos saudando os dálmatas que dormiam no quintal e cheguei exausto até o automóvel. Podia ainda sentir o sereno da madrugada anterior. Fazia um lindo dia, porém eram oito horas da manhã. Muito cedo para quem tinha ido dormir as 5h. Dei a partida e me dirigi até a farmácia mais próxima.
Acabei chegando mais rápido do que esperava. É difícil encontrar trânsito tão cedo assim no domingo, ainda mais em uma cidade do interior. Estacionei a meio fio e desci do carro. Em frente a porta, um cachorro preto, peludo e sem uma raça indentificável observava a movimentação. Parecia extremamente manso. Pensei em compartilhar algum momento com ele, mas estava mais preocupado com a minha saúde àquela altura, porém, por mais doente que eu estivesse, não podia parar de pensar no quão feio era aquele animal. Um dos cães mais feios que já pude ver, com toda certeza. Ainda bem que havia nascido como um cão, pois se fosse humano teria ínfimas possibilidades para constituir uma família.
Entrei cauteloso e tentando aparentar uma doença normal. Sentia tanta falda de ar que precisava falar pausadamente para não acabar com o fôlego. Pedi por um Berotec xarope e aguardei. A atendente estava mais feliz do que o habitual. Ou gostava mesmo de trabalhar e não se importava nem um pouco em fazer o “ótimo” turno na manhã de domingo ou algo realmente bom andava acontecendo em sua vida. Seu sorriso deixou-me um pouco mais feliz. Paguei, agradeci e voltei para o carro.
Liguei o som, tomei uma boa golada do xarope e fui até a praça mais próxima esperar o remédio fazer efeito. Estacionei na rua principal. Ficava em frente a um enorme lago. O sol refletia na água e as folhas rosas e laranjas flutuavam a cada rajada de vento fazendo desenhos invisíveis pelo céu. Era um lindo lugar para aguardar e parar um segundo para pensar na vida. Apenas eu e meus brônquios suplicando por um pouco mais de ar.
Parei para refletir enquanto Mayonaise tocava em um volume considerável. Algumas oportunidades haviam surgido, mas o amor resolveu me deixar esperando um pouco mais. Desde quando ficou tão difícil se apaixonar? Mais um ano estava passando e, pela primeira vez, senti que não havia feito nada muito importante nos últimos doze meses. Era apenas impressão, mas perceber que o tempo passa cada vez mais rápido começa realmente a incomodar. Daqui a seis anos vou estar com trinta. Um pouco infantil, mas, ao mesmo tempo, bastante assustador.
Depois de uma hora, uma hora e meia os efeitos do remédio começaram a surgir. O efeito do Berotec é um dos melhores. Você sente um relaxamento fora do comum e uma sensação de bem estar impressionante. Gosto de comparar com a sensação que temos logo depois que atingimos o orgasmo. Aquela preguiça única e incomparável, para nós homens, é exatamente a mesma. Dormir sobre o efeito do Berotec nos garante uma noite, ou dia, incrível de sono.
Já com o pulmão em ordem, dei a partida e retornei para casa. Apesar da doença, sentia-me muito bem, pois havia aproveitado um pouco da manhã de uma forma, no mínimo, relevante. Estacionei em frente à garagem, cumprimentei os cães mais uma vez e fui para o quarto. Tirei o tênis, puxei o edredom e, novamente, adormeci.
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