sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

A luz que incide sobre ele

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“Qual o problema com você? O que afinal anda acontecendo? Jogar, amar, servir, receber, vencer e falhar já não é mais suficiente? Ouvir, explicar, lutar e tentar entender já não é tão importante assim? Fugir, se esconder, observar e correr por outro caminho anda te cansando, não é mesmo?”

“Você sabe que tudo não passa de uma grande brincadeira? Que todos olham por si e querem, a todo custo, passar por cima de nós e deixar os restos espalhados pelo tapete? Que ninguém se lembraria de limpar os cacos que você quebrou? Sabe que, no fundo, tudo anda uma grande porcaria? Que só tende a piorar? Tem certeza que o mundo, hoje, é um grande barril de pólvora esperando que o primeiro lunático jogue brasas ao chão, não é?”

“Ainda querendo compor e cantar? Escrever e lembrar? Entreter e mostrar? Entorpecer e chorar? Por quê? Esqueceu-se que não existem mais novidades? As ruas, por mais cheias que estejam, continuam sempre vazias? Vazias como o seu coração ou como sua mente? Não sente mais seu coração bater, lembra-se? As veias pulsarem? O calor do sol? Não percebe que o último cliente já se foi e você continua sozinha sobre o balcão?”

“Os sentimentos já não valem nada, entende? O caráter e a dedicação perderam seu espaço? A saudade e a nostalgia só te confundem? Você não sente, não ouve e nem mesmo enxerga o poder da verdade, recorda? Onde escondeu sua montanha de mentiras? Em que lugar acha que vive, afinal? Eu não entendo, você não entende e ninguém mais nesse mundo se esforça para tentar entender?”

“E por que, meu Deus? Por que continua lutando? Por que ainda guarda esperanças? Por que ainda acredita e busca um amor verdadeiro? Por que continua a sorrir? E por que, apesar de tudo, ama tanto essa vida? Você é muito mais estranha do que eu imaginava, sabia?”

Colocou as mãos embaixo d’água que corria e lavou o rosto com muito cuidado. Manchou um pouco o pijama, mas não se importou. Escovou os dentes e depois guardou a escova no armário. Olhou seu reflexo mais uma vez e parou um segundo para refletir: “Talvez seja melhor tirar este espelho daqui.”

Um comentário:

Rícard Wagner Rizzi disse...

Fantástico, leitura agradável e um final surpreendente.