segunda-feira, 31 de maio de 2010

Manhã de Outono

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Acordei com uma dificuldade incrível para respirar. Por mais que me esforçasse, o ar dificilmente aliviava minha agonia e a cada tentativa desesperada, um chiado perturbador mostrava que algo não andava bem. Levantei-me realmente incomodado. Calcei o tênis e peguei a chave do carro. No caminho, perdi alguns minutos saudando os dálmatas que dormiam no quintal e cheguei exausto até o automóvel. Podia ainda sentir o sereno da madrugada anterior. Fazia um lindo dia, porém eram oito horas da manhã. Muito cedo para quem tinha ido dormir as 5h. Dei a partida e me dirigi até a farmácia mais próxima.

Acabei chegando mais rápido do que esperava. É difícil encontrar trânsito tão cedo assim no domingo, ainda mais em uma cidade do interior. Estacionei a meio fio e desci do carro. Em frente a porta, um cachorro preto, peludo e sem uma raça indentificável observava a movimentação. Parecia extremamente manso. Pensei em compartilhar algum momento com ele, mas estava mais preocupado com a minha saúde àquela altura, porém, por mais doente que eu estivesse, não podia parar de pensar no quão feio era aquele animal. Um dos cães mais feios que já pude ver, com toda certeza. Ainda bem que havia nascido como um cão, pois se fosse humano teria ínfimas possibilidades para constituir uma família.

Entrei cauteloso e tentando aparentar uma doença normal. Sentia tanta falda de ar que precisava falar pausadamente para não acabar com o fôlego. Pedi por um Berotec xarope e aguardei. A atendente estava mais feliz do que o habitual. Ou gostava mesmo de trabalhar e não se importava nem um pouco em fazer o “ótimo” turno na manhã de domingo ou algo realmente bom andava acontecendo em sua vida. Seu sorriso deixou-me um pouco mais feliz. Paguei, agradeci e voltei para o carro.

Liguei o som, tomei uma boa golada do xarope e fui até a praça mais próxima esperar o remédio fazer efeito. Estacionei na rua principal. Ficava em frente a um enorme lago. O sol refletia na água e as folhas rosas e laranjas flutuavam a cada rajada de vento fazendo desenhos invisíveis pelo céu. Era um lindo lugar para aguardar e parar um segundo para pensar na vida. Apenas eu e meus brônquios suplicando por um pouco mais de ar.

Parei para refletir enquanto Mayonaise tocava em um volume considerável. Algumas oportunidades haviam surgido, mas o amor resolveu me deixar esperando um pouco mais. Desde quando ficou tão difícil se apaixonar? Mais um ano estava passando e, pela primeira vez, senti que não havia feito nada muito importante nos últimos doze meses. Era apenas impressão, mas perceber que o tempo passa cada vez mais rápido começa realmente a incomodar. Daqui a seis anos vou estar com trinta. Um pouco infantil, mas, ao mesmo tempo, bastante assustador.

Depois de uma hora, uma hora e meia os efeitos do remédio começaram a surgir. O efeito do Berotec é um dos melhores. Você sente um relaxamento fora do comum e uma sensação de bem estar impressionante. Gosto de comparar com a sensação que temos logo depois que atingimos o orgasmo. Aquela preguiça única e incomparável, para nós homens, é exatamente a mesma. Dormir sobre o efeito do Berotec nos garante uma noite, ou dia, incrível de sono.

Já com o pulmão em ordem, dei a partida e retornei para casa. Apesar da doença, sentia-me muito bem, pois havia aproveitado um pouco da manhã de uma forma, no mínimo, relevante. Estacionei em frente à garagem, cumprimentei os cães mais uma vez e fui para o quarto. Tirei o tênis, puxei o edredom e, novamente, adormeci.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Em cima do chão, abaixo do céu

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13⁰C do dia 13

Apontava o relógio em prédio comercial da Marginal Pinheiros. O sol que aos poucos ia subindo só enganava os pobres mortais que se apertavam aos montes dentro do transporte público. Depois de trinta minutos em pé, no trânsito, apertado e ouvindo fofocas do cotidiano alheio, o incomodo já tinha virado raiva.

Demorei mais ou menos uns vinte minutos para passar pela catraca, ainda que minha frustração seja sempre pagar R$ 2,70 pela comodidade. Bons tempos aquele que eu pagava R$ 0,75 centavos, passava pela catraca em menos de cinco minutos e achava um lugar para sentar. Mas a pior das invenções do homem estava por vir. Malhando muito mais que qualquer academia, me segurava no popular “puta que pariu” do ônibus. Balançando como um saco de arroz pra lá e pra cá, seguido de inúmeras desculpas por dar uma cotovelada ou outra nas pessoas ao lado. Meu problema não era ser baixo, onde se segurava que era alto. Disputei lugar com uma mulher para sentar-me, ainda que na cara de pau ofereci para segurar sua bolsa, e muito grossa falou que ia descer logo. Então por que da euforia para se sentar então?

Então eis que chega o pior de todos os seres humanos, o cidadão de celular com MP3. A cara das pessoas entregava o real sentimento presente naquele momento.O fato era o seguinte, o aparelho foi feito para uso particular, como o fato condiz com o nome “particular” era exatamente o que o cidadão não fazia. Olhei para cima, suspirei e disse: Eu realmente devo merecer. As estatísticas quase nunca mentem, 98,30% desses tipos ouvem as piores músicas. Algo parecido com os tipinhos que possuem um puta som no carro, que só escuta modinha, funk ou sertanejo. E quem compra som para ou outros é parecido com quem compra coleira para o cachorro, entendem? E lógico que tirei a sorte grande de ser um funkeiro. Nada contra o funk, mas indo trabalhar às sete horas da manhã não era exatamente a música do momento.

Deu cinco minutos – “Tchum tchak tchum tchum tchum tchak olha a sequência do pente”.” É pente é o pente é o pente é pente”

...dez minutos...”é o pente é o pente”

...quinze minutos...”é o pente é o pente é o pente...PORRA!!! Você chega no seu trabalho com a sua hérnia explodindo.

Desci do ônibus. Celular tocou –“Alô.. Oi!... Sim, sim, to ouvindo! Vou ter que trabalhar no sábado? Sim, é que eu tinha...” acabou a bateria. Recorri ao telefone público. Cheguei e me espantei, acho que no meio de tantos adesivos devia ter um telefone embaixo. Faço..., 19 aninhos e fogosa..., boca quente..., ...mestiça..., sem restrições. Não tinha como não ler, tava na sua cara com as inúmeras fantasias sexuais ao seu dispor por um determinado valor. Me deu uma certo ânsia de tanto que tinha. - Alô Rosa!? enquanto falo com você aqui to pegando DST tá, mas ta tudo bem...” Antes de você usar os orelhões você tinha que colocar uma camisinha nele.

Lá estava mais um dia como outro qualquer. Vida na metrópole, metrópole da vida. Sendo em cima do chão e abaixo do céu está ótimo.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Um domingo qualquer

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Passava a maioria dos seus dias confinando em algum hospital. Não porque quisesse, mas por, desde sempre, lutar contra uma doença incurável que o dilacerava ano após ano.  Possuía uma bela feição. Olhos castanhos claros, um sorriso carismático e um cabelo loiro e liso até os ombros, cuidadosamente desajeitado, que lhe deixava com uma aparência única. Um pequeno óculos tornava seu semblante um pouco mais intelectual.

A cadeira de rodas já fazia parte de sua vida há um bom tempo. Não podia andar, muito menos correr, desde os cinco anos de idade quando havia, sem querer, caído de mal jeito descendo de um pequeno tronco da árvore no quintal. Seus ossos eram extremamente frágeis e duas vértebras foram rompidas. Não que sentisse algum remorso, afinal sabia que, por mínimo tempo que fosse, havia aproveitado pelo menos um pouco a infância.

Sempre carregava consigo uma bíblia no colo. Nunca a havia aberto e lido uma página sequer, mas sentia-se mais seguro sabendo que ela estava por perto. Como nunca pode frequentar escolas ou cursos, sua vida social era completamente inexistente. Os únicos amigos verdadeiros com que podia contar eram seus discos e livros. Sua banda favorita era o Hole e, embora nunca tivesse tido a oportunidade para desfrutar um pouco do amor, era completamente apaixonado por Courtney Love.

O ano era 2010. Exatamente no dia nove de maio, domingo, o Hole faria uma apresentação única na cidade. Talvez fosse essa sua última chance. Os médicos haviam lhe dado apenas mais alguns meses de vida e ele sabia disso. Não porque haviam lhe contado, mas porque sentia que a cada novo dia seu coração ficava cada vez mais fraco. Estava internado há um bom tempo no mesmo hospital e já tinha planejado uma fuga. Sabia que durante a madrugada poucos funcionários faziam ronda pelos corredores. Em seus cálculos, precisaria apenas ir até o elevador, descer ao quarto andar e sair pela entrada principal. Bastava ter a sorte de não encontrar ninguém durante a fuga. O grande problema seria convencer o segurança a deixá-lo partir. Ele havia guardado todas as suas economias em uma velha meia e pretendia persuadi-lo com uma boa propina.

Na madrugada que antecedia o concerto, o garoto não dormiu. Esperou o silêncio tomar conta de todo o complexo para poder colocar o plano em prática. Abriu a porta cuidadosamente, mas levou um pouco de tempo até que conseguisse sair completamente. É difícil fazê-lo sozinho quando uma das mãos está ocupada guiando a cadeira. Seus pais dormiam em casa, portanto ficava ocasionalmente sozinho durante as noites. A primeira parte havia sido fácil. Ninguém vigiava nada e esperar o elevador descer doze andares foi a parte mais difícil do processo.

Quando a porta do elevador se abriu, lentamente ele chegou até o corredor principal. Ao longe viu o segurança na frente da porta. O guarda observava a rua enquanto cantava uma canção. Não conseguia identificar qual era a música, mas resolveu prosseguir com cuidado para que o barulho da cadeira não o dedurasse. Quando chegou ao lado da porta, observou a rua com medo. O segurança sequer reparou que havia alguém ao seu lado. O garoto incomodado com a situação cutucou o braço de seu “companheiro” com o dedo indicador. O homem se apavorou de uma forma incrível. Deu um pulo para trás e começou a respirar desesperadamente, deixando escorrer muita saliva pelo extenso cavanhaque.

– O que você está fazendo aqui, meus Deus? A essa hora você deveria estar dormindo! Volte para o seu quarto! ­– Ele parecia estar se acalmando, mas o menino ficou apavorado com tais palavras, porém sabia que não era, ainda, a hora de desistir.

– Eu preciso sair! Tenho um show importante para ir logo à tarde. 

Olharam-se nos olhos por um minuto. O segurança desatou a rir. Era uma gargalhada malévola e que deixava nosso protagonista totalmente envergonhado.

– E como pretende fazer isso nesse estado? – O guarda deu um grande sorriso e tirou o rádio da cintura. Quando estava prestes a chamar os enfermeiros, o menino tirou a meia velha do bolso direito e postou quatro notas de cem sobre sua coxa esquerda. Ele havia economizado por muito tempo, mas, àquela altura, não estava muito preocupado com o quanto gastaria. Ainda havia muito mais de onde surgiram as primeiras notas. Sua meia, agora, era uma extensão de seu corpo. Era tão importante quantos seus braços e sua velha cadeira Freedom.

– Eu não posso fazer isso! – O vigilante estava realmente aflito, mas a cobiça era muito maior do que suas verdadeiras obrigações. – Tudo bem! Vou dar uma volta. Você tem cinco minutos. Desapareça daqui!

O segurança tirou as chaves do bolso e abriu a porta principal. Deixou-a totalmente livre e se afastou. Pegou, de longe, as notas e virou-se para o corredor. Começou a andar a passos largos e desapareceu na escuridão. No fone de ouvido, Smashing Pumpkins voltara a tocar. Agora que estava próximo, era possível identificar quais eram as notas e melodias.

Estava com medo, mas o objetivo final parecia muito mais valioso do que tudo que já havia feito em sua sofrida e solitária vida.  Ele foi pela rampa até a calçada e começou a andar sem destino. Os buracos no concreto dificultavam seu caminho e quanto mais esforço fazia, sentia seu coração enfraquecer pouco a pouco.

Depois de uma hora lutando contra o concreto esburacado, conseguiu enxergar uma luz vindo da esquina. Era uma avenida gigantesca, mas sentia que sua sorte estava por mudar. Não que isso lhe animasse muito, pois, afinal, não havia desfrutado muito dela (a sorte) em sua vida. A luz provinha de um boteco marginalizado de beira de estrada. Não estava, exatamente, em uma estrada, mas o local era tão acabado que lembrava o inferno. Teve medo e se conteve. Ficou na porta esperando e observando os bêbados encherem a cara um pouco mais.

Não sabia o que fazer? Estava pensativo e apreensivo quando percebeu uma mão sobre o ombro. Virou os olhos e deu-se conta que havia uma pessoa parada ao seu lado.

– Meu pequeno, você teria alguma ajuda para me dar? Preciso de mais um trago, mas estou completamente duro. Sem um puto, para lhe dizer a verdade. – Assim que terminou a frase, o homem tropeçou e caiu como uma bomba sobre o ombro esquerdo, rolou até a guia e bateu com muita força a boca na sarjeta.

Nosso pequeno segurou o riso de uma forma incrível, pois tinha medo que as chacotas lhe rendessem um assalto ou alguma agressão. Pensou em um plano obstinado enquanto o homem se levantava com o rosto sangrando.

– Tudo bem! Dou-lhe cem reais para que me leve até aqui! – O garoto tirou um panfleto do bolso esquerdo da jaqueta e mostrou ao homem com um pouco de desconfianças. Courtney estava linda e serena na gravura. Logo abaixo de suas coxas era indicado o endereço do concerto. O homem demorou cerca de dois minutos e meio para conseguir ler três palavras, mas finalmente disse:

– Por cem pratas, te levo aonde você quiser. Venha por aqui, meu carro está parado logo ali na esquina.

Ele foi seguindo, com dificuldade e esforço, o homem ate o carro. O bêbado estava em um apuro ainda maior que o dele para conseguir manter o equilíbrio. Caminhava como uma criança que havia acabado de aprender a andar e isso, ele sabia muito bem, poderia pôr em risco a vida dos dois, mas não havia  uma mínima chance para que a desistência se instalasse em seus pensamentos. O carro era um velho Opala 77 totalmente acabado, com muitos riscos, batidas e com grande parte da carroceria descascada.  Estava muito apreensivo. Um gordo alcoólatra, completamente bêbado e cheirando lixo estava assinando um compromisso com ele. A chance de tudo dar errado era grande, mas, afinal, no fim das contas, ele tinha um Opala.

Se ele havia demorado três minutos para ler um endereço, imaginem o tempo que demorou para colocar o pequeno garoto no carro com sua cadeira de rodas. O homem dirigia displicentemente. Sorte que o rádio tocava Wind Cries Marie, o que fazia com que o medo da morte diminuísse um pouco. Durante todo o trajeto, o homem havia parado quatro vezes para vomitar e quando chegaram, depois de muito tempo, ao local o dia já estava nascendo. Como tinha bom coração, o garoto ainda lhe deu cinquenta reais a mais que o combinado. O homem derramou uma lágrima de alegria e disse que ele era o único amigo que o ajudara em muito tempo. O antigo e inesgotável papo dos bêbados. O problema foi que na volta para o bar o homem bateu seu Opala com tanta força em um poste que nunca mais pôde beber. Pelo menos não mais nesse mundo.

Agora dava-se conta que estava, finalmente, no parque mais famoso da cidade. Dali há algumas horas o show começaria. A brisa da manhã e o ar puro faziam-no se sentir muito bem. Bem como não sentia-se em muito, muito tempo. Foi vendo as placas e aos poucos chegava cada vez mais perto do local do concerto. Estava exausto, mas precisava continuar. Quando conseguiu , um sentimento de conquista e alegria dominou todo o seu corpo. Havia chegado ao seu destino e, agora, precisava apenas esperar. Alguns funcionários ainda faziam a manutenção do palco e pequenos grupos de fãs já postavam-se em frente a grade. Então ele ficou ali, sozinho, no meio da grama, e cochilou.

Quando acordou, não sabia exatamente que horas eram, mas tinha certeza que estava próximo a uma da tarde. O sol o derretia aos poucos. Despertou ainda meio grogue. O show de sua vida começaria logo, logo. Tinha fome, sede e dores nos braços. Estava exausto e uma dor incomum no peito lhe incomodava, mas ele não daria real atenção ao problema. Não naquele momento.

Bem a sua frente havia um grupo de garotas conversando, rindo e chamando bastante atenção. Eram excepcionalmente bonitas e a todo momento viravam-se em sua direção  dando pequenos sorrisos. Ele tinha dúvidas. Flertar nunca havia sido um bom passatempo. Depois de alguns minutos, a mais bonita delas veio em sua direção. Ela andava como uma modelo na passarela. Tinha cabelos negros e lisos até o meio das costas. Estava suavemente maquiada e o rímel contornava com elegância seus lindos olhos azuis. Usava uma regata branca com a estampa de Ziggy Stardust. Era linda, possivelmente a garota mais linda que já tinha visto em toda a sua vida. Ficou bem na sua frente e lhe deu o sorriso mais belo e inocente que poderia. O pequeno garoto ficou perplexo. Estava nervoso e não sabia nem o que dizer. Pensou em algumas palavras tocantes, mas não teve tempo de proferi-las, pois a linda menina o bombardeou com uma pergunta pouco casual:

– Você é virgem?

O nervosismo virou raiva e a raiva o dominou por completo. O que ela queria afinal? Era cega por acaso? Era praticamente um aleijado, o que ela esperava? Teve vontade de lhe dizer a verdade e insultá-la da forma mais agressiva possível, mas era educado demais para fazê-lo. Alguns segundos se passaram sem que ninguém nada dissesse. Então ela continuou:

– Talvez seja mudo também! Tudo bem, não tenha medo! Vou lhe ensinar um pouco sobre o amor. – No momento ele deu pouco valor ao gesto, mas quando ela lentamente começou a se aproximar, o nervosismo voltou a tomar conta da situação.

A garota de seus sonhos – não que estivesse traindo Courtney, mas a partir daquele segundo podia experimentar um amor que não fosse platônico ou talvez fosse, não que isso tivesse grande importânica – lentamente foi se aproximando. Ela sentou no seu colo e o olhou profundamente nos olhos. Sua pele era clara e macia. Cuidadosamente ela tirou-lhe os óculos. Ele ainda estava um pouco cabisbaixo e envergonhado. Com o punho em seu queixo, ela levantou seu rosto e lhe deu um beijo caloroso e inesquecível. Foi um momento realmente especial. Ele estava em êxtase! Seu coração batia e ardia como nunca antes e uma alegria contagiante tomou conta de seu coração. Foi certamente uma das coisas mais incríveis que já havia experimentado. Quando o beijo acabou, a menina se levantou sem dizer uma única palavra. Deu-lhe, mais uma vez, a chance de ver seu magnífico sorriso e se foi sem, ao menos, se despedir.

Ele estava eufórico. Não podia acreditar no que havia acontecido. Sentia-se mais leve, mais vivo e, principalmente, muito mais feliz. Estava tão bem que não percebeu que as pontadas no peito se tornavam cada vez mais constantes, fortes e doloridas.

O parque já estava tomado por fãs e curiosos. Sua sorte foi ter se postado no cume de um pequeno morro, assim, apesar de estar a uma altura pequena, podia ver todo a estrutura que formaria o show. De repente um silêncio tomou conta de tudo e, então, os integrantes foram tomando conta do palco um a um. Estava ansioso e deslumbrado. Era o momento mais importante que já vivera. Dessa vez, porém, mesmo ignorando a dor, sabia que havia algo errado com seu corpo. Estava muito difícil respirar e uma dor infernal fazia com que seu braço esquerdo não se movesse. O peito dava a impressão que explodiria a qualquer momento. Nosso pequeno garoto não se importava em pedir ajuda, queria apenas ver sua musa, pelo menos, uma única vez. Os acordes de Someone Else’s Bed começaram a soar e então Courtney Love veio correndo pelos bastidores e tomou o microfone principal. Ela começou a cantar. O público delirava. Sua voz era linda e sua estrela era mais carismática do que havíamos imaginado. Nunca estivera tão feliz. Pela primeira vez sentia que a vida valia a pena, mas, ao mesmo tempo, estava ficando cada vez mais anestesiado. Estava extremamente contente. Era um momento mágico. Um momento único que havia aguardado há muito tempo.

Sentindo-se com o dever comprido, calmamente foi adormecendo. Estava cansando de lutar. Havia decidido, exatamente naquele instante, que já era suficiente. Não havia mais dor ou desespero, sentia apenas um pouco de frio. Quando seus óculos caíram sobre o colo, ele sabia que nunca mais acordaria.