quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Mais um dia

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O ano mudou, os tempos mudaram e muitas coisas começaram a acontecer. Antigos planos voltaram a tona e objetivos deixados para trás, mais uma vez, mostraram-se assombrosos, inovadores e com um potencial monstruoso. Ele havia colocado em sua cabeça que 2010 seria o ano em que sua pacata vida finalmente entraria nos eixos e algo realmente grande aconteceria. Ele sabia que era necessário estar com a cabeça no lugar e continuar seguindo a vida, mas sem esquecer o que deveria ser feito, pois, assim, sua grande chance logo chegaria.

Todos os dias o celular despertava exatamente às 06h54min da manhã. Por que às 06h54min? Ele guardava certo receio para marcar seus horários em números exatos desde que perdera o encontro mais importante de sua vida há alguns anos atrás. Depois se levantava lentamente, cumprimentava seu pequeno pinscher preto e todas as manhãs o animal ficava tão eufórico com seu despertar que as sete horas de sono pareciam ter durado uma incrível eternidade para o pequeno cão.

Assim que tomava o café, subia, cambaleando, as escadas e parava em frente ao espelho. Ficava sempre alguns segundos admirando seu reflexo e percebendo como, pouco a pouco, estava envelhecendo. Ele, seu velho samba-canção listrado e seus cabelos claros extremamente desarrumados. Então escovava seus dentes com muita atenção, depois escolhia um disco com cuidado e colocava a vitrola para tocar enquanto tomava seu banho matinal. Nos últimos dias Eric Clapton, Jeff Beck e Humble Pie haviam soado muito bem.  Quando terminado, vestia sua calça jeans, colocava um velho tênis surrado e perdia alguns minutos escolhendo uma de suas velhas camisetas, que, de tão velhas, era quase impossível identificar a estampa. Já pronto, dirigia-se até o metrô.

No caminho, perdia um bom tempo apreciando as pessoas e os tipos mais estranhos e curiosos de trabalhadores. Outro ritual, que praticava com afinco, era observar as belas mulheres com que se deparava pelo caminho. Poderíamos dizer que eram amores platônicos instantâneos que mexiam por alguns instantes com suas emoções e que provavelmente, após algumas estações, nunca mais voltaria a vê-las. Quando não havia ninguém, entretinha-se com um bom livro. Há alguns dias, Bukowski mostrava-se uma excelente leitura.

Frequentemente quando chegava ao seu destino, dava-se conta de como certas coisas haviam mudado. A garota pela qual, um dia, havia se apaixonado, simplesmente esquecera de sua existência ou parecia que não mais o conhecia. Algumas vezes perguntava-se como tudo havia acabado assim. E pessoas quais nutria uma grande simpatia, não mais o cumprimentavam e, como resposta, ele nunca perdia a simpatia, mas aos poucos acabou perdendo cada vez mais o contato.

Após uma manhã cheia de tarefas, alegria e aprendizado, partia para o trabalho. Mais uma vez no metrô e mais uma vez com os velhos hábitos, seguia a sua estrada. Logo que chegava, exercia suas tarefas com perfeição e, assim, acabava perdendo o entusiasmo, pois seus compromissos, agora, não continham nenhuma novidade. Gastava um bom tempo pensando em como poderia ganhar dinheiro de uma forma honesta e que realmente o fizesse feliz, porém dava-se conta do quanto a vida era dura algumas vezes. Seu expediente acabava e retornava calma e tranquilamente para o seu lar.

Quando entrava em casa, perdia um bom tempo brincando com seus animais de estimação e depois subia as velhas escadas de volta para o seu querido quarto. Lá gastava as últimas horas do seu dia escrevendo tudo o que lhe interessasse ou lhe viesse à cabeça. Depois retirava sua Fender Stratocaster do suporte e dedilhava algumas notas na guitarra. Quando muito inspirado, escrevia belas canções e sentia-se realmente feliz. Depois descia para o jantar, tomava um banho e voltava à cama para ler ou assistir algum de seus filmes favoritos. O aconchego do edredom e a luz inconstante da TV sempre o faziam dormir. Algumas vezes sonhava, outras não e assim era o final de mais um dia normal de uma pessoa qualquer em algum lugar desconhecido desta imensa cidade.

2 comentários:

Angel disse...

Thiago, seus textos são tão bem escritos, detalhados, que sou capaz de imaginar a cena toda, sem perder nenhum movimento, nenhum detalhe, nada. E eu gosto muito de leituras assim! Já escreveu algo mais longo? É que só conheço seus textos aqui no Marca Livro, e você leva muito jeito!

E tem sempre muito sentimento em tudo que você escreve, parece comigo, que sempre acabo colocando um pouco de mim em meus textos (não sei se é o seu caso, mas, enfim).

Quanto ao post... Bom, ficarei aqui torcendo para que, em breve, ele consiga um emprego melhor, e uma namorada bacana que o faça esquecer aquela outra lá, sem coração... rs

Abraços!

Thiago Gacciona disse...

Muito Obrigado, Angel. Fico realmente agradecido pelos elogios.

Acho que sempre que escrevemos acabamos colocando um pouco de nós mesmo nos textos independentemente de serem autobiográficos ou não.

Então, lancei um livro que se chama "Uma Simples Carta". Nesse link você pode ler uma boa parte dele e se gostar, pode comprar um exemplar depois.

http://migre.me/gdz3

Beijos!